16.12.11

Elogio da Loucura

Angela Merkel elogiou Portugal afirmando que "se pode basear num amplo consenso para prosseguir as necessárias medidas de reforma e consolidação", considerando "muito encorajadoras" as previsões sobre o défice orçamental português, que deverá descer para 4,5 por cento em 2011.

A chanceler alemã acrescentou que não só em Portugal, mas também em outros países da zona euro afectados pela crise, os programas de austeridade que estão a ser implementados "exigem muito das pessoas", e por isso elas merecem todo o respeito".

Saudou a decisão tomada em Bruxelas por 26 dos 27 países da União Europeia - a excepção foi Londres - de criar uma união fiscal e de estabilidade, considerando-as "irreversíveis".

Defendeu, porém, que a união política que será criada para complementar a união económica e monetária também tem de incluir o crescimento económico, para criar mais postos de trabalho.

E acrescentou a líder democrata-cristã, se os Estados membros não se deixarem desencorajar pelos desaires que necessariamente ainda surgirão, "a Europa saíra mais forte da crise do que entrou", vaticinou.

Angela Merkel sabe que a política de austeridade imposta à nação grega, à nação irlandesa, à nação portuguesa, à nação espanhola, à nação italiana, às nações do Reino Unido, à nação alemã, com ou sem acordos com a troika, semeia o desemprego, gera recessão e com ela menos postos de trabalho.

O povo desses países sabe-o melhor que ninguém, o povo alemão sabe-o também. E por essa razão a CDU perdeu todas as eleições intercalares no seu país. A receita da austeridade, descredibilizada em toda a Europa, é o dogma da sua política. Por isso falou bem de Portugal pela primeira vez, mas dirigindo-se sobretudo aos incrédulos eleitores alemães. Portugal, tratado com arrogância pelos conservadores alemães, esmagado pela troika e submisso, é agora o único argumento positivo de que dispõe para sustentar a sua política.

Pedro Nuno Santos, vice-presidente da bancada do PS, afirmou que se estava a “marimbar para o banco alemão que emprestou dinheiro a Portugal nas condições em que emprestou”. A maior parte das notícias sobre o assunto escamotearam o sublinhado. Veremos que tal omissão faz toda a diferença.

Tal como faz toda a diferença não reparar que quando afirma “não pagamos”, nessas condições, se referia não apenas a Portugal mas a todos os países vítimas das condições impostas pelo sistema financeiro internacional

Analisemos primeiro as condições dos empréstimos, a Portugal e a outros países:

Países como Grécia, Espanha, Portugal e Itália operam no limite insuportável com juros próximos ou acima de 7% ao ano em títulos de longo prazo. Há três meses, esses juros não passavam, em média, de 4%. Os mercados financeiros, têm uma apetite incomensurável e nenhum sacrifício satisfaz a sua voracidade. O banco britânico Barclays Capital estima que seja necessário um programa de resgate somente para as economias italiana e espanhola, no valor entre € 500 mil milhões e € 800 mil milhões bilhões para os próximos 24 meses. Ora, o FEEF_Fundo de Equilíbrio Financeiro e o recém criado MEF_Mecanismo de Equilíbrio Financeiro, não ultrapassam os 500 mil milhões. Os juros odiosos continuam a subir!

Mas vamos mais ao fundo:

Ainda que desde 2000 se tenha vindo a observar o aumento do rácio da dívida pública no PIB, até 2005 este rácio esteve sempre abaixo de 60%, o mínimo requerido pelos critérios de Maastricht, estando o seu crescimento relativamente contido até 2008. O endividamento público disparou apenas na sequência da crise financeira aquando do resgate do sistema financeiro e a recessão.

De facto, os governos europeus, como o alemão, gastaram uma fortuna para ajudar os seus bancos privados, que sofreram elevadas perdas durante a crise. O governo de Berlim teve de salvar vários bancos alemães, gastando só em empréstimos e aumentos de capital o equivalente a 70% do Produto Interno Bruto português (PIB), de acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI).

O seu sistema financeiro reorientou-se para captar a poupança interna para títulos de dívida pública alemã, aumentando o seu preço e a sua procura e logo diminuindo a sua taxa de juros (que funciona em sentido inverso ao do preço). Como esta serve de referência europeia para o risco de incumprimento, o resultado automático foi que os países que necessitam de financiar-se viram aumentar a sua margem de risco e logo depois as taxas de juro da dívida. Esta evolução desfavorável foi clara em 2009, tendo o diferencial entre a taxa de juro da dívida pública portuguesa e da dívida pública alemã, a 10 anos, passado de 60 pontos base, em Janeiro de 2009, para 116 pontos base em Janeiro de 2010.

Simultaneamente, o diferencial da cobertura de risco de incumprimento (Credit Default Swaps), da dívida externa portuguesa em relação à dívida externa alemã, passou de 45 pontos base em Janeiro de 2009, para 147 pontos base em Janeiro de 2010. A taxa de juros da dívida pública alemã a 10 anos caiu de cerca de 3,6% em Junho de 2009 para 2,29%, em Outubro 2010. Ou seja, cerca de 36 % ou 1,3 do aumento do spread (diferença entre as taxas de juro) entre a dívida pública portuguesa e a dívida pública alemã, tornando irrelevantes os sucessivos PEC.

Num movimento simultâneo, os investidores estrangeiros deslocaram os seus investimentos nos títulos de dívida para a compra de títulos dos países em crise, preferindo as suas taxas de juro, que inflacionadas pelas agências de rating se tornaram mais lucrativas, de tal modo que representam hoje ¾ da dívida externa portuguesa.

O crescimento significativo que a dívida pública e a dívida do sector bancário e empresarial registaram na última década, levou a uma evolução desfavorável do rating da República Portuguesa e, consequentemente, a uma deterioração das condições de obtenção de crédito nos mercados internacionais, tornando-o completamente vulnerável ao ataque especulativo das agências de rating.

Sendo um iletrado em finanças, retirei aqueles dados económicos de Fontes seguras: FMI. Vox.eu.(Prof Ricardo Cabral). Instituto Francisco Sá Carneiro ( segundo a síntese dos contributos de Eng. João Proença, Dr. Fernando Ulrich e Dr. Eduardo Catroga)

Voltemos à posição política de Pedro Nuno Santos e ao significado de “não pagamos, nestas condições”, sabendo agora que condições odiosas são essas.

Pedro Nuno Santos lamentou ainda que na periferia da Europa, tal como em Portugal, não existam líderes que coloquem os interesses dos seus povos em primeiro lugar e concertem posições, à semelhança do que faz a "aliança franco-alemã".

"Nós não temos um líder em Portugal que ponha os interesses dos portugueses em primeiro lugar e esse é o drama que os portugueses enfrentam hoje no nosso país, enfrentam todos os povos dos países da periferia da Europa", disse.

Ou seja, os líderes, incluindo os líderes anteriores (?) do seu partido, seguiram a estratégia errada de abandonarem à sua sorte as primeiras vítimas da acção concertada das agências de rating e do capital financeiro.

E prossegue, ainda no dia seguinte, “os países credores não podem impor as suas condições, marimbando-se para o desemprego e para a crise que provocam nos países devedores”.

Pedro Nuno Santos conclui: “O debate sobre dívida pública é um debate sobre uma negociação política e as partes dessa negociação usam as armas que têm de dispor na defesa dos seus interesses", explicou, recuperando de seguida uma expressão já utilizada pelo Presidente da República sobre os limites dos sacrifícios que estão a ser impostos aos portugueses.

"Há limites para os sacrifícios que se impõem a um povo, há limites para o sofrimento que se impõe a um povo e um Governo deve usar todas as armas negociais que tem ao seu dispor na defesa do seu povo, na defesa de condições menos gravosas para o seu povo, na defesa de condições menos recessivas para a economia, na defesa de melhores condições que permitam ao país pagar a sua dívida", advogou, sustentando que não se consegue pagar a dívida sem crescimento económico e não há crescimento económico com "austeridade em cima de austeridade".

Quatro notícias paralelas, passaram despercebidas:

Uma, que é exemplo das condições impostas pela dívida: O ministro dos Negócios Estrangeiros, Paulo Portas, revelou que a sobretaxa sobre o subsídio de Natal foi imposta pela troika como uma condição para aceitar a receita extraordinária da transferência dos fundos de pensões da banca.

Ainda sobre as condições: Freitas do Amaral, mais radical que o líder socialista, afirmou: "Alemanha e França querem expulsar-nos do euro". Antigo ministro (escolhido por Sócrates, a quem, já na desgraça, censurou por aquilo que aquele não disse) lamenta que os países europeus ricos já não reconheçam"o seu dever moral e jurídico de serem solidários com os mais pobres".

E sobre as condições que virão: A Grécia tem de ir mais longe nas medidas de austeridade. Reduzir salários já não chega. Afirma o responsável do FMI pela avaliação a Atenas, Poul Thomsen, diz que o país tem de deixar cair os tabus e, possivelmente, avançar com despedimentos e concretiza: Grécia tem de acabar com o tabu dos despedimentos na Função Pública.

E as condições oferecidas ao capital financeiro: O ministro das Finanças português revelou que o Executivo está disponível para alargar o prazo em que o Estado estará no capital dos bancos sem poderes, de 3 para 5 anos, emprestando-lhes até 11 milhões de euros, uma das medidas que tem sido defendida pela banca. Isso chama-se, “não pagar”, nas condições impostas inicialmente, chama-se “renegociar a dívida”, em favor dos bancos!








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