Estes
resultados estão em linha com as últimas eleições para os governos locais, que
incluem seis municípios especiais, 13 condados (distritos) e três municípios
autónomos. Nelas, o partido do presidente, que governava 12
desses municípios e distritos, ficou reduzido a apenas 5 e o Kuomintang conquistou 13 dos
seus governos, onde reside mais de 70% da população.
Governar
pelo diálogo, um imperativo eleitoral e constitucional
A
Constituição de Taiwan é presidencialista, o presidente nomeia o governo sem
passar pela aprovação da Assembleia Legislativa. Mas não poderá governar contra
a sua maioria de deputados, que pertencem à oposição e onde se expressa a
vontade política maioritária dos chineses de Taiwan. . A
nomeação presidencial dos membros do denominado Yuan (Conselho) de Controle e
do Yuan de Exame, bem como dos juízes do Yuan Judicial, tem de ser confirmada
pela Assembleia Legislativa. Esses Conselhos ou Yuans fiscalizam e controlam a
atividade legislativa do governo, o orçamento, o funcionamento dos seus
ministérios e agências, o sistema judicial. Os deputados legisladores elegem autonomamente
o presidente da sua Assembleia.
As
declarações do novo presidente, selecionadas pelas agências de informação
internacionais, não têm em conta a realidade global dos resultados eleitorais.
Os chineses de Taiwan não votaram maioritariamente contra a República Popular
da China, nem a favor da militarização e do separatismo.
O
voto maioritário dos eleitores de Taiwan
nos partidos da oposição e a abstenção
penalizam a política do governo. Apesar do relativo crescimento económico e do
elevado nível de educação e formação dos quadros e trabalhadores, não existe
uma política de justiça social e distribuição da riqueza: o custo da
habitação está a tornar-se inacessível, o desemprego cresce e a precaridade
também; a gestão da pandemia revelou graves insuficiências no sistema de saúde;
os serviços públicos, como os transportes, não correspondem às necessidades da
população e os escândalos políticos pioraram a imagem do governo…O resultado
das eleições locais (2022), já tinha revelado que o clamor de protesto popular
estava a crescer.
Neste
contexto político e social, a deriva militarista e separatista, que incluiu no
orçamento de 2023 um valor astronómico de 19.000 milhões de dólares, para a
compra de armamento e a multiplicação de incidentes diplomáticos com a
República Popular da China, como a visita de políticos americanos que se
deslocaram à ilha para fazer discursos hostis e ganhar popularidade entre o
eleitorado conservador dos EUA, resultou, afinal, na diminuição
progressiva do apoio popular ao PDR.
Os
chineses de Taiwan defendem a cooperação e o diálogo com a RPCh
Evoquemos
a história recente: A administração Biden e o Senado dos EUA aprovaram a Lei da
Política para Taiwan de 2022, que autoriza a transferências de armas, através
do programa Foreign Military Sales (FMS), no valor de US$ 6,5 milhares de milhões até o ano fiscal
de 2027. Na agenda de escalada das vendas estão sistemas de armas de longo
alcance, capazes de atacar o continente
chinês, como os Sistemas de Mísseis Táticos do Exército e a Resposta Expandida
de Mísseis de Ataque Terrestre Standoff, incluídos no FMS durante a
administração Trump, ao preço de US$ 18.000 milhões.
Neste
quadro internacional, e apesar da intensificação da retórica militarista do
governo dos EUA, o último inquérito de opinião publicado pelo próprio governo
de Taiwan, "Opiniões públicas sobre as atuais relações através do
Estreito" (2022/10/19~2022/10/23), sobre o tema “Independência ou status
quo”, teve apenas 14% de respostas a
favor da independência. Noutro inquérito governamental, realizado nesse
mesmo ano, apenas 44% dos inqueridos afirmou
acreditar que os EUA defenderiam Taiwan, um claro declínio em relação aos 65% referenciados em outubro de 2021.
Os
chineses de Taiwan viveram, desde 1895, 50 anos sob ocupação japonesa. O
governo da Frente Única Patriótica que derrotou e fez capitular o Japão, devolveu à mãe-pátria a soberania sobre esta
região. Mas, com a passagem da fação militarista do Kuomintang para a fase da
guerra civil, visando a conquista total do poder na Nova China e a sua derrota
e refúgio na ilha, as classes populares foram sujeitas a uma implacável
ditadura militar e dinástica, protegida pela presença da esquadra americana em
Taipé, que durou deste 1947 até ao ano de 1996, data das primeiras eleições
presidenciais.
Para
a democratização de Taiwan contribuiu decisivamente o restabelecimento das
relações diplomáticas entre os EUA e a China, tendo como base o princípio “One
China”, consagrado pelas Nações Unidas e a comunidade internacional. O
princípio de Uma Única China é o núcleo essencial dos três comunicados
conjuntos China-EUA e a premissa e fundamento para o estabelecimento e
desenvolvimento das relações diplomáticas entre a China e os EUA. Em 1979, os
Estados Unidos assumiram um claro compromisso no Comunicado Conjunto sobre o
Estabelecimento das Relações Diplomáticas China-EUA de que, “os Estados Unidos
da América reconhecem que o Governo da República Popular da China é o único
governo legítimo da China. Neste contexto, o povo dos EUA manterá as relações
culturais, comerciais e outras relações não oficiais com o povo de Taiwan”.
A
Associação de Nações do Sudeste Asiático há muito que abandonou a política da
guerra fria, sob o impulso da China e os seus tratados, asseguram a liberdade e
segurança de navegação e sobrevoo, a resolução pacífica dos conflitos, a
cooperação científica, ambiental e económica, recentemente ampliada com o
Comprehensive Economic Partnership (RCEP).
Não
há outro caminho, para o futuro comum e pacífico da China e da humanidade.
Lisboa,
14.01.2024
António
dos Santos Queirós. Professor e Investigador. Universidade de Lisboa
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