8.5.18

“Pela Glória, quem não faria grandes coisas, mas quem as faz pelo esquecimento?” Ou, as memórias de um oficial de Abril, que sacrificou a sua carreira para se opor à guerra civil e proteger os camaradas de armas






"Todos tinham armas (MDLP, PS…)… não foi entregue qualquer cartucho. Tratou-se portanto de armas sem munições, incapazes de dar um tiro… Se os comandos legais sem força militar (COPCON) anunciassem que dispunham de uma milícia de 10.000 homens, tal bluff podia travar as forças que assaltavam o poder e levá-las a negociar.
Foi o que aconteceu… Interessava mais ao Exército um bode expiatório isolado e sozinho do que um grupo de Oficiais implicados naquele desvio de armamento.” ( Das memórias, do capitão de Abril Álvaro Fernandes 

Memórias (síntese alargada) 

“...A História oficial contém muita deturpação, normalmente provocada por manipulação dirigida a determinadas interpretações póstumas ou por documentos fabricados com essa finalidade. 

…/….
Um dos acontecimentos que mais curiosidade desperta é o do desvio de 1.000 espingardas G-3 da Polícia Militar, para a extrema-esquerda, de que, até hoje somente eu assumi a responsabilidade política. 

E aqui surge o primeiro mito: que era só a extrema-esquerda que estava armada.
O MDLP-ELP era de extrema-direita e estava armado. 

Foram apreendidas 200 G-3 ao Secretário do PS Edmundo Pedro e ele não era de extrema-esquerda. O General Ramalho Eanes, na primeira entrevista que deu depois de abandonar a Presidência da República, agradeceu ao General Galvão de Figueiredo ter assumido ele a ordem para entregar armas ao PS. 

Notarão que estou a citar nomes. Mas esses não foram do meu lado nem lhes prometi nada. Estiveram do outro lado da barricada daqueles que prometi nunca denunciar.
Portanto e para já, a realidade é diferente do mito apregoado. 

Tem mais em saber se alguém estava desarmado, ou não.
E todos tinham armas. 

…/… 

Há um pormenor que passa despercebido mas revela muito das verdadeiras intenções da criação das milícias A dotação da espingarda G-3 é de 5 carregadores com 100 munições cada um mais uma caixa de reserva de 100 cartuchos. Ora só foi distribuído um carregador por arma - o que reduziu a sua equivalência a 200 e não mil espingardas, e não foi entregue qualquer cartucho. Tratou-se portanto de armas sem munições, incapazes de dar um tiro.
Existe uma razão para este facto que foi analisado e ponderado por nós. Toda a gente falava e temia uma guerra civil. 

E ninguém a desejava! 

Se os comandos legais sem força militar anunciassem que dispunham de uma milícia de 10.000 homens, tal bluff podia travar as forças que assaltavam o poder e levá-las a negociar.
Foi o que aconteceu. 

…/… 

Quando Costa Gomes voltou a telefonar ao meio-dia, Otelo disse que afinal sempre tinha havido o desvio das 1.000 G-3 de que se falava, tínhamos um microauscultador ambiental ligado ao telefone eu estava a ouvir a conversa. 

Costa Gomes interpelou-me diretamente perguntando se confirmava a como ia assumir a responsabilidade.
- Darei entrevistas à comunicação social - e foi o que fiz através do jornal República e da Rádio Renascença. 

- Muito bem, faça isso o mais depressa possível. E, como compreenderá fica suspenso de funções e aguarde em sua casa até o Conselho da Revolução tomar uma decisão a seu respeito.
Decisão que nunca chegou a ser tomada. 

Mas o alívio de Costa Gomes foi notório. 

Interessava mais ao Exército um bode expiatório isolado e sozinho do que um grupo de Oficiais implicados naquele desvio de armamento…” 

Os textos citados foram escritos pouco tempos antes da sua morte. Esta trágica circunstância conferem-lhe o valor de uma verdade moral e do mais inquestionável testemunho: 

AdSQ

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