A
origem e natureza do terrorismo
A intervenção militar e
a invasão no Afeganistão e no Iraque, na Síria e na Líbia ( e noutros conflitos
menores em África), lideradas pelos EUA e pela NATO, mas que envolveram o apoio
de governos conservadores e socialistas europeus como o da Inglaterra, da
Espanha e da França, provocaram mais de um milhão e duzentos mil mortos entre os povos daquelas nações e um
número superior a dez milhões de refugiados de guerra, que continuam a aumentar.
Ao mesmo tempo, aqueles
e outros governos europeus e os EUA apoiaram os golpes de estado dos militares
que afastaram do poder, ganho em eleições democráticas, os partidos fundados
pela Organização Irmandade Muçulmana na Argélia e no Egito, islamitas, mas
politicamente moderados e com um passado assistencialista.
A linha da frente
destes conflitos armados, envolvendo a Europa, parecia muito longe das nossas
cidades, mas, num mundo globalizado pela guerra moderna, a sua retaguarda
europeia começou a ser flagelada por ataques terroristas, primeiro pela Al-Qaeda,
mas sobretudo pelo DAESH, depois que os governos europeus cofinanciaram e deram
rédea solta à propaganda do autodenominado “Estado islâmico” e à atividade de recrutamento
dentro das próprias fronteiras da Europa. Sim, cofinanciaram e armaram: O
encontro dos "Amigos do povo da Síria", realizado em Abril de 2012,
na Turquia, juntou representantes diplomáticos de cerca de 70 países ocidentais
e árabes, onde se proclamou o Conselho Nacional Sírio _CNS como o legítimo
representante da Síria. O CNS garantiu nessa altura os salários e armamento
para os rebeldes que combatessem o regime do Presidente Bashar Al-Assad. Os militares
desertores também seriam pagos, com milhões de dólares doados por vários países
do Golfo Pérsico, sobretudo a Arábia Saudita. Ausências relevantes foram as da
Rússia, China e Irão, que em Teerão realizaram uma outra Conferência
internacional. A Conferência Nacionalista Árabe, reunida em Junho desse ano na
Tunísia, envolvendo os partidos nacionalistas e laicos nasseristas ou
“baasitas”, e outros de esquerda, defendeu a solução política não militar, tal
como a Organização das Nações Unidas.
No dia 2 de Setembro de
2014, a representante da União Europeia (UE) no Iraque, Jana Hybášková, disse
no Parlamento Europeu que alguns países da UE estavam a comprar petróleo ao
DAESH através da Turquia. Bruxelas negou mas avançou ter provas de que esse
comércio estaria nas mãos de rotas clandestinas controladas por empresários
turcos, iranianos e curdos iraquianos. Os Estados Unidos, por seu lado, alegam
que o petróleo segue para a Turquia, Jordânia e Arábia Saudita –também acusada,
com o Qatar e os Emiratos de financiar
diretamente os sunitas radicais, na guerra e na propaganda feita a partir da
criação de pseudo escolas corânicas a
ocidente. Segundo a imprensa internacional, o ‘desconto’ praticado pelo EI pode
chegar aos 60% e o lucro obtido ultrapassa os 2 milhões de dólares por dia. Para
além de petróleo, o DAESH drena para os mercados internacionais ópio, arte (que
rouba dos campos arqueológicos que também controla e que vai destruindo),
fosfatos, gás natural, cimento, trigo e cevada_ e este agregado pesa um pouco mais que o
petróleo no seu orçamento. Nos territórios ocupados saqueia ( dos bancos de
Mossul terá retirado 498 milhões de dólares) e impõe impostos de guerra e, com
a economia desagregada e os serviços sociais destruídos, pratica uma política
de distribuição de bens e serviços básicos às populações civis, que dele
dependem para a sobrevivência quotidiana. O porto turco de Ceyhan é o centro
deste mercado negro. O petróleo chega do território conquistado pelo DAESH em
longos e regulares comboios de camiões. Mas foi preciso o último ataque
terrorista em Paris para que a aviação americana atingisse pela primeira vez
esse alvo. A ofensiva aérea russa intensificou-se então, atacando em força as
instalações petrolíferas, reservatórios e comboios do DAESH. O governo turco de
Erdogan e a oligarquia que o apoia têm sido acusados de lucrar diretamente com
este tráfico, impossível de ignorar pelas autoridades.
E quando o número de
refugiados de guerra se tornou insuportável nos países vizinhos do Afeganistão e
do Iraque, da Síria e da Líbia, centenas de milhar e depois milhões, começaram
a marchar para as linhas de retaguarda destas guerras com os EUA e a União Europeia, transformando o mediterrâneo
num cemitério e batendo à porta de todas as fronteiras da UE. A Grécia,
esmagada pela política austeritária, foi deixada sozinha e sem apoios para
acolher vagas crescentes de refugiados. E foi preciso que o mar mediterrânio se
enchesse de cadáveres, para que a opinião pública e a comunicação social da UE
despertassem para o problema, sem tão pouco o resolver, pois os refugiados
tardam em chegar aos seus países de acolhimento e os novos regimes austeritários
do leste desafiam abertamente as diretrizes comunitárias.
Os governos
democráticos, a imprensa democrática, a maioria dos partidos democráticos
europeus, tem escamoteado as causas políticas destas guerras, que surgiram da
disputa dos mercados e sobretudo do petróleo e de outras matérias-primas, pelas
principais potências ocidentais, face aos regimes autoritários mas
nacionalistas dos países árabes em causa e face à Rússia, mas também entre si,
como o mostra a divisão da Líbia entre a França e a Itália: os ataques da força
aérea e do exército turco contra os curdos que combatem o DAESH, o abate do
bombardeiro russo e a aproximação do partido de Erdogan aos clérigos radicais,
são sinais inequívocos da sua duplicidade política e começaram a dividir o
próprio regime.
A extrema-direita
esconde essas causas e focaliza a sua propaganda no acolhimento das vagas de
refugiados de guerra, invocando os perigos e ameaças do terrorismo e da concorrência
no emprego. E vê crescer a sua influência política, a partir das camadas
sociais vitimadas pela política austeritária: operários desempregados,
empresários arruinados, jovens sem emprego nem educação, pensionistas e
reformados, funcionários públicos…mas também graças ao apoio financeiro, político
e de acesso
à comunicação social, fornecido discreta ou abertamente por novos grupos económicos e financeiros, para quem o estado democrático e nacional constitui um obstáculo à sua estratégia de desregulação e liberalização global do mercado. A sua propaganda contra o terrorismo e de crítica à hegemonia do capital financeiro, sob o signo da pátria e a bandeira do nacionalismo chauvinista, proclama a defesa da economia e da independência nacionais contra a oligarquia de Bruxelas, e exige internamente mais medidas securitárias e repressivas e a militarização do estado, o reforço internacional dos pactos militares agressivos.
à comunicação social, fornecido discreta ou abertamente por novos grupos económicos e financeiros, para quem o estado democrático e nacional constitui um obstáculo à sua estratégia de desregulação e liberalização global do mercado. A sua propaganda contra o terrorismo e de crítica à hegemonia do capital financeiro, sob o signo da pátria e a bandeira do nacionalismo chauvinista, proclama a defesa da economia e da independência nacionais contra a oligarquia de Bruxelas, e exige internamente mais medidas securitárias e repressivas e a militarização do estado, o reforço internacional dos pactos militares agressivos.
Os
aliados da democracia contra o terrorismo
Mas o terrorismo que
invoca o islão não penetrou no Irão ou na Palestina. Pelo contrário, a OLP e o
HAMAS, e mesmo o Hezbollah, têm condenado os atentados
terroristas do DAESH, que, do ponto de vista militar se inscrevem numa
estratégia de guerra de baixa intensidade, no quadro de uma guerra total, que
não poupa civis, nem respeita as convenções internacionais, por parte de todos
os beligerantes.
Aquelas invasões, os
bombardeamentos indiscriminados de cidades e das suas infraestruturas, a
utilização violenta dos drones, a
morte e o expatriamento de milhões de homens, mulheres e crianças, os golpes
militares contra os resultados de eleições democráticas, politizaram e
radicalizaram novos setores da população árabe e africana. Mas foi na ação dos
povos e as comunidades árabes, iranianas ou curdas, que continuam a ser as
maiores vítimas do terror e alvos privilegiados do DAESH e da AL-Qaeda, que
residiu a grande força de resistência ao fundamentalismo islâmico e de combate
ao terrorismo, e assim deverá ser também na Europa, onde as comunidades árabes,
turcas, curdas, africanas, possuem dentro de si as forças políticas capazes de
denunciar, conter e erradicar o terrorismo. Quer o compreendam ou não os
líderes políticos europeus, que continuam sem assumir a responsabilidade pelo
arrastar dos seus países para um conflito global, de Bush a Blair e Asnar,
passando por Barroso, conflito que neste cenário de confronto armado com o
fundamentalismo islâmico, toma a forma militar de guerra de baixa intensidade.
Mas que já evoluiu para a guerra aberta nas fronteiras da Ucrânia, como o fora
nos Balcãs, na guerra civil do Kosovo e no bombardeamento da Jugoslávia. Aqui,
na Europa, que afinal não assegurou a paz, depois da II Guerra Mundial, apenas
mudou os teatros da guerra.
“Os
eunucos devoram-se a si mesmo!”
A ascensão do capital
financeiro na Europa e no Mundo, o seu domínio sobre os partidos tradicionais,
levou ao poder uma nova classe de governantes, proveniente dos antigos partidos
liberais, conservadores, democratas-cristãos, socialistas e social-democratas,
que abandonaram os programas e ideais originais, substituindo-os por uma
cartilha neoliberal, que garantiu a desregulação do mercado, sobretudo do
mercado financeiro e a proteção da falência dos bancos insolventes, em nome do
risco sistémico, a proliferação no mercado global dos denominados “produtos
derivados”, como as hipotecas sobre a habitação (subprime) e a recuperação das perdas especulativas subsequentes,
através das rendas das parcerias público-privadas e dos juros das dívidas
soberanas, que foram e são inflacionados.
A União Europeia
evoluiu para uma confederação de estados em que a própria Comissão Europeia e o
Banco Central Europeu tornaram legal e prática corrente, garantir o pagamento
da dívida soberana dos países através do controle político dos governos
endividados e do seu principal instrumento de autonomia política e nacional, o
orçamento.
O Pacto Orçamental
institucionalizou assim a divisão da União Europeia entre duas categorias de
países: os que ganharam hegemonia pela força do seu capital financeiro, e a ela
pertencem não apenas a Alemanha, mas também a França, a Holanda, a Inglaterra e
até o Luxemburgo, e os países sujeitos a um regime semicolonial, como a
Irlanda, a Grécia, Portugal, Chipre e, em certos momentos, até a Itália do
outrora poderoso Berlusconi. Regime semicolonial pois ainda se conservam as
Forças Armadas e Policiais nacionais e a soberania do sistema judicial, mas
mesmo este, posto em causa pelas regras ditadas pelos novos colonizadores do
capital financeiro, que nem sequer necessitam de desperdiçar uma única bala
para impor o seu diktat: descritos na comunicação social como os amigos-salvadores
da bancarrota, esquecida que dos 70.000 milhões emprestados pela Troika, todo
este valor tem vindo a ser devolvido mais os juros superiores a 35.000 milhões,
aterraram em Lisboa arrogantemente, recebidos como aliados por um governo PSD-CDS
que mudou de natureza política, um governo colaboracionista que tomou sempre partido
contra a Constituição quando os interesses da oligarquia de Bruxelas se opunham
aos direitos nacionais.
Foi este novo quadro
europeu, de um federalismo centralistas e burocrático, que nunca tentou a via
do Federalismo Democrático, construído com base na igualdade das nações, que
emergiu dos tratados desiguais de Maastricht e de Lisboa. Os cidadãos europeus,
ainda hoje, desconhecem os seus termos e nunca os votaram, mas foi esta deriva
austeritária e hegemónica que permitiu a ascensão a presidente da Comissão
Europeia de um antigo primeiro-ministro do Luxemburgo comprovadamente
responsável pela fuga ao fisco de milhares de milhões de euros sonegados pelas empresas
multinacionais e financeiras; que consente o dumping fiscal organizado na Holanda e na Irlanda; numa Europa onde
proliferam paraísos fiscais que lavam o dinheiro do tráfico de armas, drogas e
seres humanos, como em plena City Londrina; que autoriza e reforça a autoridade
de entidades sem estatuto legal como o Eurogrupo e as Troikas, enquanto reduz o
poder do Parlamento Europeu, o único órgão eleito; que tolera a ascensão de
governos austeritários, com componentes neofascistas, na Hungria e na Polónia;
que intervém politica e militarmente na Ucrânia e na Líbia determinando quem
deve ter o poder e controlar as suas riquezas…
E explica a amoralidade
do recrutamento pelo credor FMI do antigo ministro das finanças do governo
português; da ex-ministra das finanças pela multinacional
anglo-americana que negoceia títulos detidos por sociedades financeiras, como
créditos bancários ou divida pública; do ex-presidente da Comissão Europeia
(aprovada pelo atual Presidente da República) pelo banco responsável pelo desencadear da
crise financeira mundial e a viciação das contas públicas dos antigos governos
gregos… E tem como consequência o desrespeito generalizado dos programas de
acolhimento dos refugiados ou a sanha persecutória contra a política
democrática, de centro-esquerda, dos governos de Tsípras e de Costa.
O comportamento
político destes líderes partidários em Portugal deve ser entendido como o
resultado da destruição, pela concorrência europeia e global, da elite
portuguesa financeira e de grande parte dos seus ativos empresariais. Restam
alguns grupos de menor dimensão, já sem autonomia financeira e muito
dependentes do capital estrangeiro, que tendem a aceitar como inevitável e
condição da sua própria sobrevivência, as imposições comunitárias de carater
semicolonial. Numa situação económica em que 99,8% das empresas portuguesas são
micro, pequenas e médias empresas, descapitalizadas, é natural que a maioria
dos seus empresários e sócios, administradores e gestores, continue a seguir as
propostas políticas desta elite, mesmo depois de decapitada. Arrastando consigo
trabalhadores do setor privado que temem perder o emprego, reformados e
pensionistas empobrecidos…Assim sendo, o número de votos à direita e de
abstenções não pode constituir uma surpresa política. A saída de 420.000 novos
emigrantes, dos quais mais de 60% com formação superior, explica também como se
tornou difícil renovar as lideranças sociais e políticas no nosso país.
A esta luz, num quadro
de guerra de baixa intensidade na Europa, vítima de novos atentados terroristas
e a cargo com a vaga de refugiados que a sua intervenção militar em países
distantes também provocou; numa conjuntura de desagregação da União Europeia
com a saída da Inglaterra; de ascenso da extrema-direita e de evolução
totalitária da candidata Turquia, que os líderes das potências europeias nunca
quiseram verdadeiramente integrar, com receio de perder poder… a conduta dos Comissários
Europeus que esgotam a sua ação política na ameaça de sanções contra Portugal e
a Espanha, por causa do deficit dos seus anteriores governos de direita, que já
não governam, parece irracional. Mas revela que o poder real não está nas suas
mãos, porque reside no capital financeiro e a sua lógica é afinal a de meros
farsantes políticos, que tentam manter a situação insuportável da UE: uma União
Europeia dominada por uma maioria de partidos conservadores, com outros
partidos social-democratas e socialistas a reboque. Para essa elite serventuária
do capital sem pátria e das suas próprias carreiras individuais, o inimigo está
na democracia, seja ela exercida pelo voto dos povos do Reino Unido, da Grécia,
de Portugal ou até na defesa dos direitos nacionais pelos representantes da
oligarquia de Espanha, que, mesmo no momento crítico da sua crise financeira,
rejeitaram a Troika; sim, a Espanha, deve pagar agora por não ter tido um
governo colaboracionista de direita, a não ser que Rajoy renegue Rajoy e entre
a governar minoritariamente contra os interesses de todas as nações e povos de
Espanha! E a Grécia? E Portugal? É
preciso que se afundem na pobreza e no caos económico e social, “o inferno” que
Passos Coelho anuncia e deseja, para que toda a esperança de uma sociedade mais
justa e de uma europa democrática e pacífica morra e seja punida; e ele e os
seus correligionários prevaleçam no poder por mais 50 anos, até ao esbulho
final da riqueza da nação, em privatizações tomadas pelo capital internacional,
parcerias público-privadas, ajudas à banca ( a partir de então, privada e estrangeira) e juros leoninos da divida pública.
Nesta perigosa
situação, a permanência e reforço do governo de centro-esquerda constitui uma
barreira eficaz contra a catástrofe nacional, pela democracia na União Europeia
e a conquista da paz e da segurança internacionais.
25 de Julho de
2016
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