16.3.15

Rumo estratégico para Portugal. O Estado da Nação Portuguesa e as Alternativas


“Congresso da Cidadania. Ruptura e Utopia para a Próxima Revolução Democrática”










 
 
 
 
 
 
 Ascensão e queda das reformas neoliberais

A partir do final dos anos 80 e com a eliminação, na vida social e no texto constitucional, das mudanças revolucionárias na propriedade e nos órgãos de estado, conquistadas pela revolução democrática de 74/75, o modelo ocidental de mercado e de democracia política ficaram plenamente reconstituídos em Portugal e em condições extremamente favoráveis para a iniciativa privada, dado o afluxo de fundos comunitários e de receitas e oportunidades geradas pelas desnacionalizações.

Quando a crise financeira se desencadeou nos EUA e na Europa, a resposta neoliberal contava assim com uma larga base social de apoio no nosso país: a oligarquia financeira e neomonopolista; os empresários exportadores, com diferentes níveis de riqueza, da indústria, do comércio, dos serviços e da agricultura; uma casta de burocratas partidários, ascendendo da administração pública aos conselhos de administração das empresas privadas e aos lugares reservados da burocracia europeia.

Essa base alargou-se nas classes populares com o desemprego crescente, o abandono do mundo rural, o empobrecimento da classe média, que ficaram ainda mais dependentes do poder discricionário do aparelho de estado, em questões vitais como a fiscalidade e o acesso aos financiamentos e fundos europeus, o direito ao emprego e à proteção social.
O capital internacional penetrou profundamente em todos os setores económicos e financeiros nacionais.
Estava crida uma nova situação política em Portugal, que trás no bojo a ameaça de uma crise geral nacional.

Renegociação da dívida pública ou da dívida global?

O debate político em Portugal acerca da dívida continua a ser reduzido à dívida do estado.

Mas em 2011 a dívida das empresas e da banca, elevava-se a 248% do PIB, duas vezes e meia superior à dívida pública, 98,2% do PIB, na altura em que Portugal foi obrigado a aceitar o diktat da troika, que não é apenas de natureza económica, mas sobretudo política.

É interessante recorrer ao estudo da consultora MacKinsey Global Institute (MGI), de janeiro de 2012,para conhecer o fenómeno da dívida global ( a dívida soberana, mais a dívida da banca, empresas e famílias): ele evidencia, desmentindo a propaganda neoliberal, que a generalidade dos países sofre de um problema crónico de dívida, na sua relação com o valor do PIB. Tendo como referência 2010, podemos constatar que nas 10 maiores economias o rácio da dívida global é de 348% do PIB.

Este fenómeno não deixou de se agravar com a política de austeridade. A 'dívida' em termos globais cresceu significativamente desde o início da crise financeira de 2007, para atingir 286% em proporção do Produto Interno Bruto (PIB) mundial, em 2014.

O sistema financeiro mundial desregulado e fora do controle dos estados, da justiça e da democracia, vive muito acima das suas possibilidades e criou para si próprio um valor artificial de triliões de dólares e de euros, transformando as crises financeiras cíclicas em crises estruturais e globais.

Os juros altos são a fonte da exploração das nações e dos seus fabulosos lucros. Em Portugal, tomando como base a década de 2000 a 2010, só os juros acumulados e pagos pela dívida pública ultrapassaram os 53.000 milhões de euros.

Agora o perigo da bancarrota nacional transferiu-se para o futuro próximo do país, porque se agravaram todos os fatores de rotura financeira e económica, de crise geral nacional.

O Diktat da Troika: Antidemocrático e semicolonial


Os bancos (e os Fundos Financeiros) sediados em França são os que possuem mais dívida soberana europeia e dívida privada, seguidos pelos alemães

À luz desta realidade financeira, melhor se compreende a proposta eleitoral de François Holland para o futuro da UE, que, no contexto de um programa progressista que incumpriu, não deixou de nele incluiruma outra proposta que procura impor o federalismo orçamental em torno do eixo franco-alemão e dos países fundadores da União Europeia, agora em nome da necessidade de construir um programa de crescimento económico e “de transição ecológica” da economia, mas que deixará num segundo círculo de menor cooperação aqueles outros países que não aceitem as políticas defendidas por esse primeiro círculo decisor. E ainda a proposta de entregar ao G 20 (os 20 países mais ricos) e ao FMI a tarefa de regular os desequilíbrios orçamentais e reformar o sistema monetário internacional, sem mencionar qual será o conteúdo dessa reforma e identificar a instância internacional que a regulará, desvalorizando cada vez mais o papel das Nações Unidas.

Em Portugal, a natureza política desta direita, não apenas ultraliberal e autoritária, mas também capituladora e colaboracionista nas questões da soberania nacional, não foi inicialmente percecionada pelas diferentes classes populares, apesar de ter proclamado como seu programa a destruição da Constituição e o agravamento da sujeição nacional.

A constituição da Troika, associando a CE, o BCE e o FMI também não foi entendida como um ato neocolonial. Mas o seu programa de austeridade, imposto como condição do empréstimo e do pagamento de juros elevados, institucionalizou um novo instrumento de poder na UE que funde os interesses do sistema financeiro com a governação política e económica, passando uma fronteira política que nenhum dos PEQs anteriores se atrevera a transpor:

Quando retira, com o pacto Orçamental, aos governos a sua soberania sobre o orçamento do estado e sobre a ação governativa, sujeita  a Grécia, a Irlanda, Portugal e Chipre a um novo  diktat semicolonial, pondo em causa o carater democrático da atual União Europeia e agudiza as contradições entre ao  países do norte e do sul; mas, ao mesmo tempo, cria condições para aproximar as nações submetidas a essa política e para a união das diferentes classes nacionais em torno de um programa democrático e patriótico.

O neoliberalismo conduz à crise geral nacional, ao autoritarismo, como já aconteceu na Hungria e ao confronto militar, da Jugoslávia e do Kosovo à guerra civil na Ucrânia.

A não ser que a esquerda que se reclama do passado revolucionário e do (s) socialismo (s), assuma a responsabilidade histórica de lutar diretamente pela partilha do poder, por razões políticas e éticas, pois o dever dos revolucionários, dos socialistas, comunistas e de todos os progressistas e patriotas, quando a sua utopia está longe, é lutar pelas reformas políticas e sociais realizáveis hoje e no seu próprio país, minorando o sofrimento do seu povo.

E não apostar na lotaria eleitoral, na ilusão de receber em troca do desespero popular mais votos, que o flagelo da crise empurrará para a direita; ou no discurso sectário, que desgasta o aliado potencial mas deixa o poder real nas mãos do adversário político.

A natureza do movimento sindical e dos movimentos de cidadãos: defensivos, pacíficos e democráticos

O movimento sindical e os movimentos de cidadãos em Portugal caracterizam-se hoje pelo seu carácter pacífico (mas não imune ao desespero dum novo “proletariado em farrapos”); por serem defensivos_ a sua reivindicação fundamental é o direito ao trabalho e por estarem politizados, nas suas lideranças, contra o domínio e a corrupção do estado democrático pelas oligarquias financeiras e políticas.

Enganam-se no entanto as análises políticas à esquerda que creem que as contradições que fizeram estremecer o governo resultam da envergadura da luta e do elevar da consciência popular.

A deriva autoritária e repressiva do governo do PSD/CDS foi por hora sustida, não tanto pela força da luta sindical e das manifestações nacionais de cidadãos, mas pela ação fiscalizadora do Tribunal Constitucional e de algumas iniciativas parlamentares convergentes da esquerda, que incluiu deputados do PS, CDU e BE.

Mas também e isso não tem sido reconhecido pela esquerda, com o surgimento de um forte movimento democrático e patriótico no seio das forças armadas e militarizadas, que impediu o executivo de utilizar a polícia em força contra as manifestações e lutas populares e de manipular os militares em favor da sua política antinacional.

Este conjunto de ações, movimentos e articulações partidárias pontuais, configuraram o nascimento de um novo arco constitucional, ainda inorgânico, que se alargou ao sistema judicial, tradicionalmente conservador.


Os movimentos democráticos nas Forças Armadas e Policiais

O movimento político nas forças armadas (e nas forças policiais) é um movimento político democrático e constitucionalista. Não é nem revolucionário, nem corporativo, nem ilegal.

A efetiva democratização das forças armadas e militarizadas e o reconhecimento do seu estatuto especial e da legitimidade da ação das associações representativas dos oficiais, sargentos e praças, tal como das associações das diversas forças policiais, constitui um imperativo democrático e ético que decorre da constituição de Abril e do fato histórico que a democracia tem uma dívida de sacrifício, de sangue e de luto, para com as gerações de militares que tiveram de fazer a guerra colonial e as suas famílias. 
A sua atuação não pode ser coagida, reprimida e vilipendiada como corporativa e ilegal, mas reconhecida como democrática e constitucionalista, constituindo um contributo legítimo para a democratização do estado.
Em paralelo constitui um imperativo democrático e patriótico a denúncia da Lei de Defesa Nacional, imposta pelo governo PSD/CDS à revelia do sistema de consulta e debate constitucional e mesmo contra o projeto apresentado pela comissão que escolheu para o efeito.

Alianças e compromissos à esquerda, para um programa dirigido a todo o povo português

As alianças políticas não podem ser confundidas e reduzidas à participação no “governo de coligação”.

Quando PS, PCP e BE convergiram no parlamento para despenalizar o aborto, esse foi um ato político de aliança.

Quando, no passado, todas as forças de esquerda convergiram para a vitória de Mário Soares sobre o candidato presidencial da direita, ou para apoiar as candidaturas de Sampaio (à Câmara de Lisboa ou à Presidência da República), estamos de novo em presença de alianças políticas pontuais concretizadas num objetivo e num programa.
   
As alianças políticas e a questão do governo


A proposta de “governo patriótico e de esquerda”, tem o mérito de definir claramente um inimigo principal _ o capital financeiro mundial, mas ao excluir o PS, comete um duplo erro: cai no vazio, pois à esquerda do PS não existem forças políticas organizadas suficientes para superar a direita e afasta deste proposta de frente ampla ou progressista a base social daquele partido.


Se fosse expectável um grande ascenso das lutas e movimentos populares em Portugal e na Europa, com o emergir de novas vanguardas revolucionárias, aquela alternativa de governo poderia sê-lo a curto prazo, mas numa situação de recuo e defesa extrema dos movimentos populares e democráticos, não é realizável.

Acresce que ao identificar a pátria com os partidos de esquerda, diminui a sua frente ampla, pois exclui a base popular dos partidos de direita e uma parte das suas personalidades e líderes, que se têm pronunciado ativamente em defesa da soberania nacional.

A estratégia da oligarquia partidária

O PSD e o CDS, no atual quadro constitucional, não são inimigos políticos, apenas adversários. No entanto, as atuais direções do PSD e do CDS, ao escolheram a política do austeritarismo, colocaram estes partidos no campo do inimigo.

O PS português não é monolítico, é oscilante e contraditório na sua ação política, conforme as tendências políticas dominantes, a força do movimento popular e a corelação de forças nacional e internacional.

Na próxima conjuntura eleitoral, a eventual vitória do PS com maioria absoluta, face à sua inconsequência programática e vulnerabilidade deste partido à influência do neoliberalismo, conduziria provavelmente ao fracasso da sua governação, e, depois, a um ainda maior desprestígio do socialismo (s) e a uma deriva autoritária que triunfou na Hungria, ascende na Polónia, progrediu na Grécia e agora ameaça a própria França, Holanda e Itália, depois da governação dos partidos socialistas.

Crise geral nacional e saída democrática para a crise
 O perigo de ir além da Constituição e da revisão presidencialista da Constituição


Neste quadro, o perigo que se vislumbra no horizonte, é o da crise geral nacional, em que “os de cima” já não podem governar como dantes, em democracia liberal e “os de baixo”, ainda não têm capacidade política, organização e força para ascender a um novo poder. Uma crise geral nacional que não teria provavelmente uma saída revolucionária, mas sim reacionária.

Uma deriva autoritária preparada pela via da redução da dimensão da Assembleia da República (e pelo partido único nos executivos municipais) e, mais adiante, pela mudança de regime em favor do presidencialismo, como parte da revisão subversiva da constituição, primeiro na prática política, depois na lei fundamental. Um verdadeiro golpe de estado “a frio”, que até pode vir a ser legitimado por um referendo.

A necessidade de um programa de frente ampla (ou progressista), constitucional, democrático e patriótico


Perante este quadro, é óbvio que as tarefas democráticas e patrióticas dos partidos de esquerda regressam à ordem do dia.
E na defesa da soberania nacional, irá travar-se um confronto sem precedentes face à questão da soberania sobre o mar português

Uma plataforma política para um governo democrático e patriótico

Face à atual dispersão das forças políticas, personalidades e movimentos democráticos e patrióticos, portadores de diferentes ideologias e ideários políticos, a sua organização política tem de assumir um carater frentista e realizar-se em torno de um programa comum, que corresponde, na nossa opinião, a três grandes linhas de ação política:

De recuperação da democracia e da dignidade ética do estado
De resgate da soberania e defesa da paz
De consolidação das liberdades e direitos fundamentais inscritos na Constituição

Essa convergência, em conformidade com o peso eleitoral e capacidade de ação política dos seus representantes, deverá viabilizar uma alternativa de governo que se comprometa a realizar parcial ou plenamente esse programa,

E apoiar um candidato presidencial de frente única comprometido com a defesa da Constituição de Abril.

Por uma Europa democrática e pacífica, num mundo multipolar

A Comissão Europeia e os EUA estão a concluir as negociações do chamado Pacto Transatlântico, que consagra todas as políticas neoliberais que prevaleceram na Europa sob a consigna da austeridade. No plano político (e militar?), este pacto agressivo, negociado sem mandato nem escrutínio das nações e dos povos, é justificado como uma estratégia para enfrentar a ascensão da China e do bloco dos BRICS, que apresenta um plano de reforma e controle do sistema financeiro internacional, que contempla a criação de uma agência de rating independente e o controle dos paraísos fiscais.

Mas, em paralelo, desenvolve-se um movimento de aproximação dos BRICS de inúmeros países americanos, africanos e asiáticos, com diferentes orientações políticas.

Portugal, deve acompanhar este movimento, para ganhar autonomia e dispor de alternativas à política europeia de Federalismo autoritário e neoliberal, sem deixar de lutar por um processo de integração europeia democrático e pacífico, que privilegie a democracia política, a não ingerência e a solução pacífica e cordial dos diferendo, a igualdade e reciprocidade nas relações multilaterais.

O nosso país pode escolher o seu próprio caminho, contribuir para o relançamento do movimento pela Paz mundial sob a consigna de destruição e proibição de todo o arsenal atómico, biológico e químico mundial, mais ampla e mais importante que a mera dissolução da NATO e defender o primado das Nações Unidas sobre todas as outras instituições internacionais, como fórum da paz e da resolução pacífica dos conflitos e epicentro da ação militar e política contra o terrorismo, o narcotráfico, o comércio ilícito de armas e de seres humanos, a crise ambiental e todas as ameaças que pesam sobre a Humanidade e a Vida.

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