27.1.15

A União das Pátrias: A vitória do Syriza e as mudanças na Europa



 
      
 

Alexis Tsipras, lider do SYRYZA e novo primeiro-ministro grego, proclamou na hora da vitória da sua coligação:

"O povo grego soberano deu-nos hoje um mandato claro, forte e indiscutível. A Grécia está a abrir uma nova página. A Grécia está a deixar para trás a austeridade que provoca a destruição, a deixar para trás o medo e autocracia. Estamos a deixar para trás cinco anos de humilhação e dor. E a Grécia vai seguir em frente com otimismo, esperança, dignidade e num passo firme em direção a uma Europa em mudança. E o SYRIZA, vós e o SYRIZA, o nosso povo, somos um bom exemplo dessa Europa em mudança. Foi o nosso povo e a Grécia que deram este passo, um passo adiante na história, um passo em frente ao encontro dos outros povos da Europa.

Que Europa em mudança é esta, de que fala Tsipras?

A Europa dos cidadãos e dos governos da Irlanda e da Itália, de cores políticas opostas, que apoiam a proposta de Conferência Europeia sobre a dívida, lançada pelo Syriza.

Os governos daqueles países, mas também os partidos de todas as esquerdas e das direitas nacionalistas das nações europeias, que reclamavam do Banco Central Europeu as medidas que, finalmente, o seu presidente anunciou perante a iminente vitória do programa do Syryza e, pela primeira vez, vencendo a oposição do governo conservador da Srª Merkel: o financiamento do investimento económico na União Europeia e a compra direta das suas dívidas soberanas, reduzindo os juros especulativos;

A Europa dos economistas de todos os quadrantes que recordam ao governo de coligação conservadores-socialistas da Alemanha que uma política de austeridade empobrecedora dos seus parceiros no Euro conduz à deflação no mercado europeu,  onde se escoam 80% das exportações germânicas.

A Europa das nações que já não aceitam a política intervencionista das Troikas, apoiada pelos partidos conservadores, liberais e social-democratas, e o diktat da sua cabeça política alemã, que impôs através da Troika acordos semicoloniais à Grécia, à Irlanda, a Portugal e a Malta, e só falhou nesse propósito em Espanha porque o seu governo, sendo conservador, não foi colaboracionista; o governo de Merkel que promoveu a ingerência política nos assuntos internos dos seus parceiros europeus, derrubando governos eleitos como o de Berlusconi, o de Papandreou e o de Sócrates, por não serem suficientemente submissos…obrigou a vender ao desbarato as melhores empresas nacionais…estabeleceu nos acordos taxas de juro leoninas, muito superiores à evolução do próprio mercado financeiro…

Na Grécia, as tendências evidenciadas nas eleições para o parlamento europeu, para os governos municipais e para os governos regionais foram confirmadas pelas eleições de 25 de janeiro. O Syriza fica a dois deputados da maioria absoluta

Panos Kamenos, o líder do ANEL, partido nacionalista que, como o SYRYZA, sempre se opôs ao diktat da Troika e à política de austeridade, que trouxe consigo a venda das empresas nacionais aos fundos privados sem pátria, a ruina de muitas das pequenas e médias empresas e a destruição das funções sociais do estado, aceitou ser o seu aliado no novo governo, numa base política clara:

"Chegou o tempo de reconstruir o que foi destruído pelos memorandos e libertar a Grécia das correntes de subjugação. Hoje é um momento de responsabilidade para todos os gregos, independentemente de crenças ideológicas e políticas. É hora de todos os gregos a se unirem, tal como os resultados eleitorais criaram uma nova realidade social e política.”

Os quatro pilares do Plano de Reconstrução Nacional constituem o essencial do programa eleitoral do Syriza, referendado pelo voto popular 1. Enfrentar a crise humanitária. 2. Recuperar a economia e promover a justiça fiscal. 3. Recuperar o emprego 4. Transformar o sistema político para aprofundar a democracia.

Todas as medidas previstas são acompanhadas pela avaliação do seu custo benefício e incluem um verdadeiro programa de emergência social, que parte da proibição do confisco das casas de família pelos bancos e pelas Finanças, pela restituição aos reformados com rendimentos inferiores a 700 € do seu subsídio de Natal, pelo restabelecimento do fornecimento de energia elétrica a 300.000 famílias que caíram na pobreza e a criação de um programa partilhado para fornecer aos mais pobres as refeições básicas…mas também pela proteção das pequenas e médias empresas da expropriação e leilão dos seus bens pelos bancos e pelo fisco…

No centro desta política, a renegociação para baixar as taxas de juro da dívida soberana, medida que por si só permitiria financiar a maior parte do programa. Recorde-se, partindo do caso português, que só no período de 2000 a 2010, isto é, mesmo antes da crise financeira desencadeada pelo crash das hipotecas bancárias que se estendiam dos EUA à Europa, o nosso país pagou de juros da sua dívida soberana um valor superior a 53.000 milhões de euros, mais do dobro do que vai receber do novo quadro comunitário de apoio.

Não é difícil encontrar em Portugal necessidades, problemas e exigências políticas semelhantes às do povo grego, que, em Espanha, já foram assumidas pelo novo partido “Podemos”, nascido dos movimentos sociais de protesto e que lidera as sondagens para as próximas eleições.

Discute-se agora a capacidade do Syriza realizar o seu programa, enfrentando todo o poder e influência do capital internacional, que assumiu o controle do governo alemão e da União Europeia. Perguntamos, pode a Srª Merkel continuar a impor ao povo Grego a sua política de austeridade e de autoritarismo, sem pôr em causa a imagem já degradada da Comissão Europeia que controla e, representa a hegemonia dos partidos conservadores na União Europeia aliados aos partidos socialistas europeus?

A maioria parlamentar do seu governo depende do apoio do partido socialista alemão, o SPD. E se este alinhasse com uma nova vaga de austeridade e represálias políticas, caminharia para a sua própria desagregação, como agora aconteceu na Grécia ao outrora maioritário PASOK.

É que, desde as eleições legislativas de 2013 que a esquerda alemã tem a maioria absoluta no Parlamento Alemão 319 lugares, fato correntemente obliterado pela comunicação social, correspondendo a 192 deputados do SPD ( socialistas), 64 do Die Linke ( a esquerda comunista e socialista) e 63 Os Verdes (Ecologistas).

A direita votou útil no partido conservador, a CDU/CSU, da Srª Merkel, mas, no seu conjunto, desceu no número de deputados. A CDU e o seu aliado bávaro CSU ganharam mais 72 deputados, mas o FPD perdeu 93. O balanço final é da perda de 21 lugares no Parlamento ou Câmara Baixa, a favor do SPD e uma maioria de esquerda.

As coligações de esquerda governam desde então a maior parte dos estados alemães, em alianças que vão do  SPD  ao Die Linke  e passam pelos Verdes.

Estes partidos conquistaram a maioria de esquerda nas duas Câmaras do estado federal alemão,  a Câmara baixa ou parlamento e a Câmara Alta onde estão representados os estados federais, expressando assim o sentimento maioritário do povo alemão de discordância da política autoritária e neocolonial dos conservadores.

Mas o SPD optou por apoiar o regresso ao poder da Srª Merkel numa coligação de governo sob a liderança do partido conservador, a  CDU.

O povo grego elegeu uma maioria que exige uma mudança na política europeia, restaurando a soberania das nações e a dignidade na vida dos seus cidadãos.

O suicídio do velho farmacêutico frente ao parlamento grego, que antecedeu as penúltimas eleições gregas e a sua carta de despedida apelando à revolta, é demasiado parecida com o ato de desespero do jovem vendedor ambulante tunisino que se imolou pelo fogo quando a polícia lhe retirou o carrinho com o qual ganhava o seu pão. Na Tunísia, como na Grécia, “os de baixo” já não podiam viver como dantes. Mas na Grécia e na Europa da união europeia, “os de cima” ainda conseguem viver como dantes, ou ainda mais ricos, e podem empurrar a União Europeia, a Alemanha e a França para a aventura de dois círculos de países, divididos pela sua riqueza atual e as forças armadas gregas para um novo golpe de força.

Mas, nesse caso, a Europa poderá conhecer a segunda revolução democrática contemporânea, a primeira, emergiu em 25 de Abril de 1974 em Portugal e tal como aconteceu na altura, as suas consequências, no quadro de uma crise geral nacional na Grécia, serão imprevisíveis.

 

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