Os partidos vitoriosos em
Portugal celebram o lugar a que chegaram e esquecem que 33% dos votos com 69%
de abstenções significa que vão para o Parlamento Europeu com o apoio de pouco
mais de 10% dos eleitores nacionais, num caso e noutro, com uns 3% desses
eleitores...
A abstenção e o voto
branco, já não representam desinteresse pela política, mas em boa parte
consciência (mesmo que difusa ou alienada) de que o poder não está no
Parlamento Europeu, que ao elegermos deputados europeus não estamos afinal a escolher
quem vai governar a Europa.
Mas se, pela primeira
vez, a participação eleitoral sobe acima dos 50%, tal não pode significar o
emergir de uma consciência primária da necessidade de substituir o Federalismo
financeiro, que agora reina na União Europeia, por um Federalismo Democrático
de estados soberanos capaz de enfrentar os males da globalização e a sua crise
ambiental?
(Federalismo não
significa o fim da soberania, mas o atual Federalismo que impõe aos países em
dificuldades o orçamento austeritário significa de fato perda de soberania, o
orçamento nacional é o principal instrumento de governação autónoma e soberana
de qualquer tipo de democracia)
O Federalismo Democrático
de estados soberanos, não enfrenta, ao mesmo tempo, os desafios da globalização
e o nacionalismo chauvinista que é, aparentemente, a única via para proteger as
nações do diktat dos mercados financeiros e dos seus obscuros agentes, fundos e
empresas?
Há 8 anos, a crítica a um
artigo de F. Louçã sobre o Federalismo e a questão da saída da União Europeia
(que, neste ponto, mudou de opinião, legitimamente), cujo conteúdo se insere na
reflexão acima exposta.
Resistência e alternativa: A esquerda europeia e a crise da dívida
Contributo de António dos Santos Queirós
26 de Dezembro, 2011 - 00:21h
O artigo de FL é longo, complexo e
estruturado com um estudo muito sério, fundamentado numa base técnico-científica,
mas acessível, das questões económicas e políticas. Exige renovadas leituras
atentas e uma análise progressiva de todas as importantes questões que levanta.
Mesmo que a esquerda fora do Bloco o ignore, ele fará o seu caminho. Pior seria
que os militantes do Bloco não lhe dessem a atenção que merece. ( e não
deram, nem militantes, nem dirigentes)
Pela sua abrangência de tema, comporta
certamente omissões e ou temas simplificados, quer pela economia do debate quer
por necessidade de maturação, que só a discussão coletiva e o contraditório
permitem aprofundar. Quer ainda, porque coloca na ordem do dia novas questões
políticas, enunciadas originalmente, mas não menos relevantes.
“A primeira solução autoritária
contra o austeritarismo: o federalismo”
Escreve FL: “Veja-se então a primeira
proposta, o federalismo. Segundo esta proposta, se há uma crise da dívida, a
solução estaria na transformação da União Europeia num Estado unificado, com
uma autoridade fiscal única, um governo único e um orçamento único. É a saída
“por cima”. Há uma dívida, o Estado Europeu que se encarregue dela e que dirija
o nosso orçamento a partir de agora. Eles que tomem conta disto.
O federalismo é um conceito que, em si
mesmo, diz tudo: a federação é uma forma de organização de um Estado, com regiões
ou províncias (nos Estados Unidos ou no Brasil chamam-se estados) com alguma
margem de autonomia, mas submetidos a um poder político centralizado, que
decide o orçamento e a política económica e social, que tem leis uniformes, um
exército e uma representação externa.”
E conclui FL: “Um governo europeu
significaria que a Inglaterra e a França poderiam ser governadas de Berlim.
Impossível.”
Mas o federalismo orçamental
instalou-se, depois da última cimeira de dezembro e o Orçamento de Estado é o
instrumento principal de gestão económica de um país. Com o consentimento
maioritário dos governos europeus liberais e conservadores ou socialistas e de
forma autoritária: um verdadeiro golpe institucional nos tratados europeus
anteriormente negociados. É a Alemanha de Merkel que governa a Europa. O seu
opositor, o governo conservador de Inglaterra, foi-o por razões nacionalistas e
eleitoralistas, defendendo os interesses do capital financeiro alojado na City.
O impossível tornou-se realidade, pelo menos por agora. Como já eram realidade
“as leis uniformes” de que fala FL, as que fazem desta Europa a região que mais
contribuiu para combater a mudança climática e recuperar a saúde do ambiente,
mas também onde a legislação comunitária afasta o estado democrático da
propriedade dos meios de produção, fundamento jurídico da atual e derradeira
política de privatizações das empresas lucrativas do estado português.
E continua FL, no seu argumentário
político contra a solução Federalista: “Imaginemos que não havia nenhuma
resistência, que o consenso era forte, que o federalismo tinha vencido e que o
Estado Europeu era criado, e que o seu governo era eleito, tudo hipóteses
bastante extravagantes. Só que, como se verificou nas eleições para o
parlamento europeu, o resultado dessa eleição seria uma estrondosa vitória da
direita europeia, incluindo os sectores mais populistas e agressivos.”
Este argumento, a verificar-se, não é
relevante, porque na atual situação os resultados eleitorais têm sido já de
estrondosas vitórias da direita europeia e a os conservadores e liberais são
largamente maioritários nos governos europeus dos últimos 50 anos.
Para concluir: “O Estado Europeu
não é por isso democrático, porque exclui a democracia representativa realmente
existente, que é a que existe nos Estados-Nação. Ainda não há nem houve
qualquer forma de democracia internacional, que tenha como base de sustentação
a legitimação perante um povo global. Faz falta, mas não existe.”
O Estado Federal não tem de excluir a
democracia representativa. Ao contrário, mesmo na Alemanha atual, a esquerda
tem ganho as eleições para os parlamentos e governos estaduais (Berlim, Baden
Wuerttemberg, Renânia-Palatinado_o estado de Merkel…).
Na Espanha, onde triunfou o PP
conservador, os nacionalistas catalães e bascos ganharam as eleições para os
parlamentos e governos regionais e cresceram, incluindo o partido político
ligado ao movimento independentista basco o AMAIUR, que conquistou o maior
número de deputados (7). Na Catalunha, a descida ligeira da Esquerda
Republicana, que manteve os seus 3 deputados, foi contrabalançada com a subida
da Esquerda Unida, que passou de 1 para 3. O Federalismo não constitui sempre o
fim da nação e, pode mesmo ser a solução para que o estado democrático espanhol
se conserve unido. A Catalunha já é hoje, de facto, um estado semi-federado,
assumindo-se institucionalmente como ” nação”.
O Federalismo pode ser oligárquico ou
democrático. Os maiores estados dominando os pequenos, ou cada estado, por mais
pequeno, com o mesmo peso político nos órgãos institucionais. (Ver os casos da
Suíça e dos EUA ou mesmo da Alemanha ou da China). Na versão democrática, o
Federalismo Europeu é hoje uma Utopia, mas, porventura, fará o seu percurso
político.
Acrescenta ainda, FL, um argumento de
peso: “Nesse momento, chamávamos também a atenção para o significado
imperialista da ideia do Estado Europeu: com ele chegam um exército e um
aparelho repressivo unificado”.
Mas, observamos nós, a NATO já cumpre
bem esse papel e a cooperação entre os aparelhos policial, serviços de
informação e sistema judicial, intensifica-se, para o bem (combate ao crime
organizado, ao terrorismo, defesa civil…) e para o mal! Na verdade, ainda
durante a presidência do democrata Bill Clinton, a estratégia militar americana
evoluiu da presença direta em todos os cenários militares, para a criação de
uma rede de aliados preferenciais que vão executando as tarefas de controle e
intervenção militar onde os interesses estratégicos dos EUA se sentem
ameaçados. A Austrália na Oceânia, a Inglaterra na Europa e agora os países de
Leste face à Rússia e aos seus aliados e, como se viu na intervenção na Líbia,
já com Obama, a França, que se assume como o gendarme da Àfrica. (Não será
estranha a esta estratégia, a dimensão insustentável do Orçamento Militar dos
EUA, que em 10 anos quase duplicou. O estado americano, endividado como a
antiga potência soviética pelos formidáveis gastos improdutivos do complexo
militar industrial_em 2001, 379 biliões e, em 2010, 687 biliões de dólares, 6
vezes mais que a China e 11 vezes mais que a França, que ocupa o terceiro lugar
deste sinistro ranking mundial, caminha para a implosão e só a compra dos
seus títulos de dívida pela China_1.300 biliões de dólares e pelos países
árabes, mantém ainda o precário equilíbrio).
Talvez fosse este momento, no contexto
da reflexão de FL, para analisar e debater as contradições e convergências
entre a política financeira dos EUA e da União Europeia, nomeadamente a questão
da hegemonia do dólar e da sua posição como moeda de referência internacional.
A atual crise financeira e o ataque das agências de rating visa a destruição do
Euro e manter esse domínio? Há uma contradição entre os interesses dos
financeiros de Wall Street e o complexo militar-industrial americano, que ganha
nas exportações com a valorização do euro em relação ao dólar? Mas deixemos por
agora esta questão, para nos concentrarmos na proposta tática de FL.
E chegamos ao momento da definição de
uma política alternativa. Aqui a argumentação de FL parece não só enfraquecer
como tornar-se contraditória. Considerar ainda hoje que o “principal adversário
da nossa alternativa de projeto é o federalismo”, ao mesmo tempo que se afirma
“Nem as partes da social-democracia que a defendem – e que são alguns partidos
quando estão na oposição, nem todos e nem sempre – terão um protagonismo
suficiente para colocarem na agenda essa solução. Nem ela ganhará credibilidade
noutros sectores de esquerda. Pura e simplesmente, ela não existe no campo das
decisões”, é, em si mesma, uma argumentação política contradita.
Pois se a proposta não tem apoio em
“nenhuma das burguesias – nem as opiniões públicas – de qualquer dos grandes
países aceitaria a incógnita de um governo europeu.” E lhe falta “…para isso o
consentimento social e a hegemonia ideológica”, não pode ser a principal ameaça
a uma alternativa de esquerda.
Mas não é só contraditória: está, em
parte desfasada da nova realidade gerada pelo surgimento da crise financeira em
2007. Na avaliação tática do principal adversário do europeísmo de
esquerda, denuncia o Federalismo Europeu na sua forma global, os
Estados Unidos capitalistas da Europa e prevê a sua impossibilidade.
Mas a realidade política evoluiu de
forma diferente, com a política de desmantelamento dos
acordos políticos e até do próprio princípio de negociação que desenvolveram e
ampliaram a União Europeia e a sua substituição pela tutela da oligarquia
político-financeira germano-francesa, com um Federalismo autoritário, imposto
progressivamente e a golpe institucional.
O austeritarismo como
FL o classificou e bem, é mais do que um reforço da vigilância sobre os
orçamentos, é a subversão da ordem constitucional democrática e do princípio da
igualdade e reciprocidade entre os direitos e interesses das nações
comunitárias. Cada passo neste caminho já é um passo de gigante contra a
democracia e o direito de as nações a disporem de si próprias. E já não está só
em causa a possibilidade da saída voluntária e nacionalista de um país da zona
euro e do acordo da União Europeia; mas a ameaça de marginalização e expulsão
dos países mais dependentes, primeiro a Grécia e depois…? Mas tal significa que
o “Contrato pela Europa” (documento do BE), fez uma avaliação incompleta
nesta matéria e é preciso corrigi-la.
É o que faz FL, e de novo bem, na minha
opinião, ao elaborar o programa do europeísmo de esquerda”
“…os objetivos essenciais que definem
o europeísmo de esquerda que temos vindo a defender:
• A obrigação do BCE de certificar e de comprar dívida soberana de cada Estado,
• O lançamento de obrigações europeias mutualizando parte da dívida,
• A desvalorização do euro para aliviar as economias,
• A tributação do capital e o fim dos offshores, em particular o de Londres e do Luxemburgo,
• A criação de uma agência europeia de notação para os títulos privados,
• O reforço do orçamento europeu para um plano de criação de emprego,
• A criação de regras fiscais comuns como uma taxa mínima para o IRC, para evitar a concorrência fiscal entre Estados,
• A reestruturação profunda da dívida da
Grécia, em prejuízo dos bancos credores.”
Como é óbvio, nenhuma destas consignas
políticas é de combate às teses Federalistas tradicionais, que, assim sendo,
desaparecem do lugar de alvo principal. Ou, dito com mais conteúdo político,
são medidas de combate ao Federalismo Oligárquico imposto a golpe e propõem
medidas que se integram numa estrutura (ainda incompleta, FL irá propor mais
adiante a cúpula deste programa, com duas Câmaras) de Federalismo Democrático
para a Europa. ( a afirmação é minha)
Prossegue FL: “Dito tudo isto, a
minha conclusão é esta: a ideia federal do Estado Europeu unificado não vai ter
qualquer papel determinante na política portuguesa ou europeia nos anos que
vivemos. Haverá medidas de reforço do Conselho, da Comissão, do BCE,
criar-se-ão fundos comuns e regras rígidas, vigiar-se-ão orçamentos e
políticas, nada que não conheçamos com a tutela dos credores hoje em dia.
Haverá medidas para os tais pequenos passos de avanços e recuos, mas não haverá
o salto imenso para um Estado Europeu federal.”
Já o demos, da pior maneira e é
prudente, em sentido oposto, ver o que sucede depois da derrota de Sarkozy na
França e de Merkel na Alemanha.
“A segunda solução autoritária
contra o austeritarismo: sair do euro e da União Europeia”
Afirma FL: “A segunda solução, em
contrapartida, terá um peso crescente no debate político. A proposta da saída
do euro será persistente, é com ela que nos vamos defrontar. Ela será defendida
por dois tipos de correntes: os economistas que recusam o espartilho do euro e
não encontram outra solução, e as esquerdas que preferem o nacionalismo ao
arrastamento da crise europeia.”
FL argumenta e demonstra que “é uma
resposta que propõe uma austeridade salarial permanente e indiferente à
economia que afeta as pessoas.”
Face ao novo quadro económico criado
pelo abandono do euro, questiona as vantagens previstas: “Alguém acha que se
pode impor a nacionalização dos bancos, que colapsaram com a desvalorização;
depois apresentar como solução o corte com os credores externos; e esperar ao
mesmo tempo ter um mercado aberto para as exportações que vão salvar a
economia? Ou seja, a socialização do capital e ao mesmo tempo a aliança com
projetos exportadores bem acolhidos pelo capital em todo o mundo?”
Conclui assim que esta solução não
interessa ao movimento popular e à esquerda.
A dado passo, analisa as condições
estratégicas para uma rotura em favor de uma alternativa de governo
socialista:”… o não isolamento internacional é uma questão de vida ou
de morte para um governo socialista, que precisa de ganhar apoios na Europa e
no mundo para a sua luta.” Sublinho a justeza desta ideia e o seu
coerente desenvolvimento político:
“Faço aqui um parêntesis para tornar
clara a minha opinião numa questão ideológica: sim, estou certo de que a
nacionalização do sistema financeiro é uma necessidade estratégica para a
política socialista, porque o sistema de crédito deve ser um bem público. E
estou também certo de que um governo de esquerda terá de enfrentar a
resistência do capital financeiro, que é o seu principal adversário, e pode por
isso ser forçado a um imperativo realista mesmo que inconveniente de
nacionalização em condições que não sejam as desejáveis para o seu sucesso. Mas
não deixo de pensar que deve fazer tudo o possível para construir sempre as
melhores condições para a sua ação. Como toda a experiência histórica
demonstra, o não isolamento internacional é uma questão de vida ou de morte
para um governo socialista, que precisa de ganhar apoios na Europa e no mundo
para a sua luta.
E a sua avaliação da correlação de
forças “Em todo o caso, para vencer é preciso ter a força necessária e,
para que seja possível ter um sistema de crédito público que funcione, é
preciso um tempo certo para uma política vencedora contra os especuladores.
Ora, entendamo-nos bem, nenhuma das atuais discussões sobre a saída do euro é
acerca de um hipotético governo de esquerda e desse tipo de situação. Por isso
mesmo, o que importa agora são as relações de forças concretas, as que existem
agora e as que podemos criar no contexto de uma resposta social muito mais
forte contra a ditadura da dívida. É o que podemos fazer e o que vamos fazer,
não um romance de ficção política. Fim de parêntesis.”
Ao longo do texto, desenvolve-se a
análise que parte da ideia central que “A política que dirige a Europa é
autoritária mas consensual entre a direita e a social-democracia”.
E conclui, FL: “Se me permitem,
recomendo-lhes por isso que não contem com a social-democracia europeia: ela
não vai erguer uma alternativa europeia, porque defende para a Europa o Tratado
de Lisboa com o seu Diretório e o euro tal como ele existe.”
Questionamo-nos? Nada mudou na
social-democracia, nos partidos da Internacional Socialista, depois do início
da Revolução Democrática na África do Norte, depois da crise financeira mundial
e das derrotas pesadas das suas lideranças tradicionais?
“O europeísmo de esquerda é a
referência da política socialista”
FL passa então a analisar mais em
detalhe a construção de uma alternativa política: “Começo pela Europa.
Bem sei que, desde o definhamento dos Fóruns Sociais Europeus, não se tem
conseguido refazer um dispositivo mínimo de resposta. O Partido da Esquerda
Europeia é muitíssimo limitado, como outras redes em que participamos; nunca
conseguimos concretizar a nossa proposta de um grande congresso dos movimentos
sociais e políticos europeus; e os partidos de esquerda do Norte da Europa
receiam os efeitos eleitorais da defesa do povo grego contra o estrangulamento
da dívida e nem querem ouvir falar de uma greve europeia.”
É aqui que falta a análise da situação
do movimento popular em Portugal e na Europa e da correlação de forças entre as
classes sociais: Qual é a natureza do movimento? Não sabemos exatamente o que
pensa FL, nesta matéria, mas conhecemos a estratégica que define, pela
reestruturação da dívida, denunciando a dívida odiosa, em que a direção do
golpe principal é a auditoria da dívida. Tal proposta, parece-me a mais
ajustada à atual conjuntura política, em que o movimento sindical e os
movimentos de cidadãos em Portugal se caracterizam hoje pelo seu carácter
pacífico (mas não imune ao desespero dum novo “proletariado em farrapos” mais
do que às vanguardas revolucionárias, que não se vislumbram na Europa mas sim
no Norte de África); por ser defensivo_ a sua reivindicação fundamental é o
direito ao trabalho e por estar politizado e internacionalizado contra o
arbítrio e a corrupção do estado democrático pelas oligarquias financeiras e
políticas sem pátria.
Mas a partir daqui FL não desdobra e
elabora esta tática para a aplicar à questão da alternativa de poder imediato,
do programa e do governo da nação portuguesa que deve suceder ao governo de
maioria PSD-CDS.
O movimento é tudo, a alternativa de
poder, nada? Não está claro, neste problema crucial, o pensamento político de
FL.
Ainda mais uma nota sobre os novos
movimentos sociais, nascidos à margem dos partidos políticos, incluindo o BE,
que na Europa e nos EUA ocupam as ruas: não podemos confundir estes movimentos
com os movimentos revolucionários dos países árabes. Estes são movimentos insurrecionais,
que ocorrem numa situação objetiva revolucionária; aqueles, os novos movimentos
sociais europeus, não são formas de organização superior do movimento popular,
mas sim formas elementares, com reduzida capacidade de intervenção política.
Se é certo que constituem uma prova
indireta da perda da capacidade de atração política dos partidos de esquerda e
da sua eventual falta de democraticidade, tal não deve ser confundido com o
elogio do movimento espontâneo contra a organização política: sem organização
política permanente o movimento dilui-se e desaparece como água na areia. Essa
falta de eficácia política faz com que possam coexistir, em Espanha, como em
Portugal, grandes movimentações da geração à rasca, precários e indignados
ocupando as praças e uma vitória massiva da direita em eleições gerais.
A alternativa tática tem que ser capaz
de englobar a ofensiva e a defensiva. E é aqui que sublinho, o emergir de outra
ameaça política que este governo está a gerar no seu seio e na oligarquia que
governa o país, “a democracia musculada”, de que falava o dono da Mota Engil e
a sua institucionalização pela prática governativa e com a revisão
constitucional:
Perante a crise e o peso insuportável da
dívida soberana, o estado da República de Portugal, o primeiro estado nacional
verdadeiramente democrático para todos os cidadãos, no que respeita ao reconhecimento
pela Constituição, que não na vida real, da igualdade de direitos políticos e
sociais face ao poder e às leis, independentemente da classe, género ou cor da
pele, o estado democrático, é retratado como um monstro gorduroso, confundindo
democracia e desgoverno. E a direita triunfa nas eleições tendo como bandeira
política o seu desmantelamento no governo e no texto constitucional.
A destruição do estado nacional e
democrático é hoje uma consequência da nova globalização promovida pelo capital
financeiro sem pátria nem controle pelo direito internacional, as nações
africanas como as suas primeiras vítimas e agora os países da periferia da
Europa. Como escreveu o liberal Paul Krugman, a propósito dos 6,7% de juros
impostos à emissão da dívida portuguesa em janeiro de 2011:” A few more
successes and the European periphery will be destroyed.”
O diktat da Troika e agora do orçamento
de estado constituem uma forma inédita de neocolonialismo na Europa democrática
do século XXI. Tal como o assalto da tecnocracia financeira aos governos grego
e italiano e a sua forte presença no governo português (Vitor Gaspar).
Encontrar e aproveitar a mais pequena
brecha no conglomerado de interesses da oligarquia, é a missão da tática
política, sobretudo quando a derrota é pesada e o risco de maiores danos para o
movimento popular permanecem.
O governo Passo Coelho-Portas aceitou
vender os últimos anéis do estado: privatizar parcialmente a CGD, entregar as
suas posições nas empresas mais lucrativas, tornando o nosso estado miserável,
incapaz de financiar a sua função social, mas também a segurança, a justiça, a
educação, o serviço nacional de saúde, a segurança social ou a defesa nacional,
e inclui entre os seus apoiantes os defensores de uma “democracia musculada”, e
é preciso sublinhar este facto político, pois há outra alternativa a este
governo, que é o de um governo mais autoritário legitimado por sucessivas
alterações legislativas e, no culminar do processo, uma revisão constitucional.
Como há uma alternativa para a Europa
dos 27, que é uma estratégia Federalista progressiva e discriminatória, com
dois círculos de países, os mais ricos e poderosos que irão impor as cláusulas
dos tratados e reservarão a zona euro para si e os arruinados pela crise, que
partilharão apenas alguns dos acordos da União Europeia e poderão ser expulsos
do Euro.
Que alternativa de ação tática propõe FL
e qual é o seu programa e objetivo estratégico:
“Devemos por isso explorar, com os
nossos aliados, a ideia de recuperar o Fórum Social – ou de abrir as portas a
uma nova forma de rede global –, talvez de o reunir em Espanha, com os
movimentos dos Indignados, para lançar uma agenda europeia para a luta contra a
austeridade. E, com eles, manter os objetivos essenciais que definem o
europeísmo de esquerda que temos vindo a defender.
Finalmente, a proposta da refundação da
Europa é o centro do europeísmo de esquerda. Deve ser concretizada. Devemos
trabalhar mais na sua explicitação, propondo por exemplo um novo Tratado que
crie duas câmaras, um parlamento eleito diretamente e uma câmara que represente
em igualdade todos os Estados, para mobilizar as duas dimensões da Europa, ou
uma única câmara com representação que evite a marginalização dos países
pequenos e médios.”
Mas estamos afinal em presença de uma
proposta de Federalismo Democrático, de dupla representação, nacional e cidadã:
É a Utopia. É certo que FL não define os poderes atribuídos a estas Câmaras,
mas se todos os cidadãos votam para uma delas e todos os estados, em pé de
igualdade, tomam assento na outra, não é esta a base institucional e política
do Federalismo…. Democrático?
Escrevo democrático e não o classifico
como socialista, porque esta última classificação política pressupõe uma vaga
revolucionária, atravessando vários países, em favor de uma nova ordem social,
socialista, que não se vislumbra no estado de consciência e de luta dos
movimentos populares europeus.
Continuemos a especulação política, que
nada tem de anticientífico, se se basear nas ciências políticas e na observação
do fluir da realidade objetiva: Um estado europeu que realizasse a utopia das
duas câmaras proposta por Louçã, seria provavelmente o melhor aliado
internacional para a transição socialista de qualquer um dos seus membros onde
o movimento popular conquistasse uma etapa mais elevada de democracia política,
económica e social, uma nova ordem socialista.
Na experiência histórica do nosso país e
essa é ainda uma lição atual da revolução democrática de abril, os avanços mais
profundos da revolução social tiveram como resposta o boicote económico, o
cerco político e a ingerência estrangeira, mas apanharam igualmente toda a
esquerda impreparada para ultrapassar a desorganização das forças produtivas e
sem um programa para a democracia socialista. Esta questão, a da transição para
o socialismo nas condições atuais, que é de programa, estratégia e ação tática,
nenhum partido a resolveu na Europa.
Seria a altura, e prossigo na utopia, de
invocar a experiência da República Popular da China (desconhecida e mal estudada),
em sentido oposto: Em Macau e Hong Kong, os acordos de integração respetivos
obedeceram ao princípio de “um país, dois sistemas”, exemplo maior de
democracia política, sem paralelo em qualquer outro país e que baralhou os
dogmas das ciências políticas. E permitiu manter o capitalismo na sua forma
democrática naquelas duas regiões autónomas, em paralelo com o estado chinês
que se autodefine como uma República Popular em transição para o socialismo
(Artº 6º da Constituição da República Popular da China (1999)”. «A base do
sistema económico socialista da República Popular da China é a propriedade
pública socialista dos meios de produção, designadamente a propriedade de todo
o povo e a propriedade coletiva do povo trabalhador. O sistema de propriedade
pública substitui o sistema de exploração do homem pelo homem e aplica o
princípio «de cada um conforme as suas capacidades, a cada um segundo o seu
trabalho» «No período inicial do socialismo, o Estado persiste no sistema
económico fundamental, tendo por principal a propriedade pública com o
desenvolvimento conjunto da economia de propriedades diversificadas, e no
sistema de distribuição tendo por principal «a cada um segundo o seu trabalho»
com a coexistência de meios diversificados de distribuição.»)
Enfim, Portugal, ou outro pequeno país,
que não pode evoluir desligado da economia mundial, dominada pelas potências
capitalistas modernas, proclamando o direito a constituir uma nação autónoma e
um estado socialista dentro da Europa democraticamente federada, segundo o
princípio de uma Federação e dois sistemas. Utopia pura, face à conjuntura, mas
seguramente uma realidade política mais fácil de impor nesse contexto político,
do que numa Europa e num mundo dividido por estados concorrentes e dominantes.
Fim da utopia (Uma questão a estudar?) e
regresso ao imprevisível fluir da realidade política, onde as formas do capital
e do seu poder político se tornaram voláteis, como Marx previa. Numa situação
tão grave e instável, a derrota eleitoral das oligarquias na França (Março
2012) e na Alemanha (2013) pode desencadear um movimento político sem
precedentes que aponte para um caminho de reformas em sinal oposto ao
percorrido.
Continuemos a analisar o plano tático
proposto por FL, para Portugal:.
“Em primeiro lugar, rejeitamos a
ideia de que não existem alternativas ao plano da troika…Exige-se por isso mais
ofensiva, sacudir a letargia social, ganhar iniciativa.
• Portugal precisa de vencer o
plano da troika, porque ele significa empobrecimento e desemprego para no fim
ter mais dívida (o maior aumento da dívida desde sempre, 125% do PIB em 2014,
diz o Banco de Portugal). O fim da submissão à austeridade é a condição para a
democracia poder decidir. É ela que define todo o nosso quadro de diálogos,
convites e alianças.
• Devemos apresentar um plano para o
emprego, indicando os sectores em que é possível desenvolver a economia: criar
emprego a partir de uma política industrial baseada em novos sectores
estratégicos, investimento público, reduzir em meia-hora o horário de trabalho
em vez de o aumentar, proibir os despedimentos em empresas com resultados,
etc.”
Responder a mais meia-hora com menos
meia-hora, pode parecer simplismo, tem de ser explicado, tal como têm de ser
concretizados os novos sectores estratégicos sugeridos como criadores de
emprego. E a questão da “transição ecológica da economia”, que nasceu à
esquerda do espectro político, não deve ser ignorada.
“…/…
• A alternativa imediata para recuperar a economia é a criação de moeda, e o Estado pode fazê-lo através do banco público, da capitalização da CGD e do efeito multiplicador que pode ter uma injeção de liquidez em investimento para o emprego, criação de novas indústrias, exportações e sobretudo substituição de importações.
• A alternativa imediata para recuperar a economia é a criação de moeda, e o Estado pode fazê-lo através do banco público, da capitalização da CGD e do efeito multiplicador que pode ter uma injeção de liquidez em investimento para o emprego, criação de novas indústrias, exportações e sobretudo substituição de importações.
Uma palavra mais sobre a criação de
moeda. Esta é uma alternativa concreta à saída do euro e à desvalorização do
escudo, e tem a enorme vantagem de não atingir os salários e rendimentos do
trabalho, permitindo pelo contrário o aumento da atividade económica com custos
de crédito mais baratos, orientados para a produção e portanto com mais
possibilidade de equilibrar a balança externa.
É uma questão nova e carece de
explicação, sobretudo se tem um alcance equivalente à saída do euro ou à
desvalorização do escudo. Que quantidade de euros, em que escala de milhões
estamos? A sua emissão é suportada pelas nossas reservas de valor? Não pode
fazer crescer de forma incontrolada a inflação? A União Europeia não se lhe
pode opor? Não é verdade que os bancos nacionais da Zona Euro não têm autonomia
para imprimir dinheiro?
Prossegue FL, indicando uma nova frente
de luta: “Em segundo lugar, e porque a apresentação de alternativas deve
conduzir ao confronto social, é na luta contra a dívida que nos devemos
concentrar. “
Finalmente a orientação central da tática,
segundo FL.
“Assim, sugiro a seguinte orientação:
• A ideia da renegociação da
dívida deve assumir uma forma mais concreta: reestruturação. Ou seja, anulação
de uma parte da dívida. A proposta, que tinha razão e ganhou força, é até cada
vez mais apoiada por economistas diferentes, e mesmo por políticos de outras
opiniões. Mas já está em segundo plano, porque respeita mais ao argumento do
que ao movimento.
• No movimento social e na disputa direta,
o centro deve ser a auditoria à dívida. E toda a clareza: a auditoria faz-se
para recusar toda a dívida abusiva. Isso mesmo, serve para recusar pagar a
dívida abusiva. Esse é o “não pagamos” que tem coerência. Atacar os credores
onde eles são mais fracos, porque culpados. “
A auditoria da dívida conduzirá também à
compreensão da origem e composição da dívida, isolando as proclamações
esquerdistas que se pronunciam radicalmente em favor da consigna “não pagamos”.
Por mais sincera que seja esta palavra de ordem, e aparentemente progressista,
a verdade é que, por exemplo, metade dos nossos fundos de pensões está
investida em títulos da dívida pública nacional, o que conduziria ao absurdo de
provocar a falência e a perda de metade das pensões de reforma dos
trabalhadores e cidadãos portugueses.
Mas o movimento para uma auditoria
cidadã da dívida só terá sucesso movimento só terá sucesso político se for
amplo e nacional, e sobretudo, se conseguir falar aos que “não pensam como
nós”, se articular a ação dos especialistas com a mobilização dos cidadãos e
com a luta política que confronte o estado democrático e as suas instituições e
partidos, com o imperativo político, jurídico-constitucional e ético de
promover o combate à corrupção e o combate à sua própria corrupção e para
mobilizar os cidadãos com esse objetivo.
As alianças
Após as análises anteriores, FL está em
condições de sistematizar a sua proposta política para a atual conjuntura:
“Esta orientação tem uma ideia
nuclear: sim, chama-se resistência. Mas, se a única alternativa à resistência
que quer criar movimento social é procurar uma fantasia – o nacionalismo, o
capital exportador, ou o federalismo de António José Seguro – então é
preferível mesmo fazer resistência
E, se é política a sério, discutamos que
interessa na política: as alianças. O federalismo serviria para nos juntarmos
ao PS. “
É aqui que devia entrar a avaliação da
política de alianças do Bloco e dos outros partidos de esquerda, que conduziu à
derrota eleitoral e à perca de influência política de todos os seus partidos.
Reproduzo aqui a minha contribuição sobre a matéria, apresentada em anterior
artigo, publicado no âmbito deste debate com o título “Miséria do Estado e
Estado Miserável. Porque perdeu a esquerda as eleições!?” E atualizo-a.
A arte do compromisso e a
política de alianças
A arte do compromisso é uma das
componentes da coerência reformadora e revolucionária, sob o princípio de que é
válido todo o compromisso que permite elevar e não rebaixar a consciência
popular.
Não podemos considerar que exista uma
generalizada cultura política em Portugal: tal não acontece em virtude da
substituição da propaganda política organizada dentro e fora dos partidos,
pelas ações de agitação eleitoral mediatizadas; por causa da transformação das
juventudes partidárias em antecâmaras dos corredores do poder; pela redução da
atividade partidária aos períodos e formas de ação eleitorais; pelo
esvaziamento da democracia dos congressos e da sabedoria coletiva dos órgãos
partidários. Pela escassez de informação política de qualidade na comunicação
social, sobretudo sobre temas internacionais e pelo enfraquecimento da educação
política nas escolas públicas e privadas, sobretudo no ensino superior, com um
crescente preconceito contra as ideias rotuladas de marxistas….À medida que
saímos do centro urbano para as periferias, da cidade para o campo,
reencontramos o analfabetismo (ainda quase 1 milhão de pessoas em Portugal) e
um ainda mais vasto analfabetismo funcional, acompanhados por um elevado índice
de iliteracia política.
Se o fenómeno de degradação da vida
democrática dos partidos políticos afeta sobretudo os da oligarquia no poder,
acabou por se disseminar entre a esquerda, nuns casos substituindo a ação
política pela ação sindical e noutros pela concentração da atividade
organizativa e de ação política no aparelho eleitoral. O enfraquecimento do PCP
nas autarquias e empresas, a fragilização da organização sindical e
cooperativa, a reduzida expressão política do BE nestes campos políticos, são o
sinal de que também nesta esquerda o trabalho político de base tem vindo a
decair ou está por fazer, mais acentuadamente no mundo rural e em torno dos
problemas da crise ambiental.
Alianças políticas e governo de
coligação da esquerda
As alianças políticas não podem ser
confundidas e reduzidas à participação no “governo de coligação”.
Quando PS, PCP e BE convergiram no
parlamento para despenalizar o aborto, esse foi um ato político de aliança.
Quando, no passado, todas as forças de esquerda convergiram para a vitória de
Mário Soares sobre o candidato presidencial da direita, ou para apoiar as
candidaturas de Sampaio (à Câmara de Lisboa ou à Presidência da República) ou
de Alegre, estamos de novo em presença de alianças políticas pontuais
concretizadas num objetivo e num programa.
Portanto, não só é redutor olhar a
política de alianças, no terreno da luta pelo poder e pelo controle dos órgãos
de estado, apenas na ótica da coligação (com partilha de cargos
governamentais), como é ignorar a própria experiência política nacional e do
movimento popular.
Assim, “a impossibilidade histórica de
as esquerdas se entenderem em Portugal”, opinião comum entre os politólogos de
esquerda, como a de André Freire e sobretudo propagandeada pela direita para se
afirmar como a única alternativa estável de governo, também não corresponde à
realidade política do país, mas continua a ser muito eficaz na propaganda
eleitoral.
“Mais recentemente, o Bloco apresentou
15 propostas concretas para o Orçamento em negociações propostas pelo governo,
e confirmou que votaria um orçamento que consagrasse a prioridade do emprego e
do salário qualificado (ignoro se Freire discorda destas 15 medidas, porque
nada diz sobre o que deve fazer o governo)”, escreveu Francisco Louçã no âmbito
do debate em curso (“Para pensar o futuro: vale a aposta de um governo de
coligação dentro da economia cruel?”) E esta foi uma proposta de participação
na política de governo de Sócrates, arrancando-lhe um compromisso mínimo em
defesa dos direitos democráticos e populares. E conclui Louçã: “Mas o governo
virou-se naturalmente para o PSD, porque era quem lhe garantia o ataque ao
Estado social e o corte nos salários.”
Ora esta ação tática, passou
praticamente despercebida na opinião pública nacional e o que prevaleceu, nos
meses seguintes, foi uma orientação de sinal contrário: moção de censura para
derrubar o governo numa correlação de forças desfavorável à esquerda. Na altura
em que o governo Sócrates ainda resistia à entrada da troika e à pressão das
agências financeiras, e recuperava para o PS outros valores da esquerda, nos
costumes ( a legalização do casamento homossexual), na educação ( as “novas oportunidades”), no ambiente ( as
energias renováveis), e aqui o que conta não é a ”nossa” consciência crítica da
inconsequência do PS nestas políticas, mas o modo como elas são percecionadas
pela sua base popular. Estas políticas de “esquerda” trouxeram (provavelmente)
de novo para o PS uma parte do seu eleitorado, tal como (provavelmente), as
conversações Bloco/PCP terão trazido outros, os que conservam preconceitos anticomunistas.
Governo democrático de esquerda e
programa de transição para o socialismo
Esta oscilação tática (que incluiu uma
reunião com a direção do PCP sem resultados políticos nem sequer o da sua
continuidade) e uma grande crispação interna como ponto de partida para o
debate destes temas, evidenciam que o problema das alianças políticas e da
alternativa de governo e de poder, é fundamental para o futuro político do
Bloco e da sua unidade (as dissidências e os abandonos não depuram nem reforçam
os movimentos políticos democráticos, antes enfraquecem-nos e os maus métodos
de discussão radicalizam estupidamente as posições; neles, movimento políticos
democráticos, a decapitação e a morte política são abolidos).
Exige-se, pois, um debate aprofundado,
que retire lições da experiência da revolução em Portugal e da luta política na
Europa (e Louçã convoca a trajetória dos Verdes e da Refundação Comunista,
questão pertinente mas face à qual é preciso dizer que estes partidos são de
uma matriz muito diferente do Bloco e que no caso dos Verdes a sua evolução
política ainda decorre), mas também de outras experiências internacionais. Como
no Brasil, onde, sem perda de coerência programática e autonomia partidária, as
forças revolucionárias que lutam pelo socialismo fazem há muito parte da
maioria de governo do PT. Um debate que conduza à reavaliação da estratégia, da
tática mas também à elaboração do programa de transição para o socialismo.
O Federalismo ou os Federalismos? A luta
de classes no seio da social-democracia
E retorno à conclusão de FL: “E, se é
política a sério, discutamos que interessa na política: as alianças. O
federalismo serviria para nos juntarmos ao PS. “
O conceito de Federalismo engloba
diferentes conteúdos políticos e na proposta de FL, a realizar-se, a que chamei
Federalismo Democrático, seriam os velhos partidos socialistas europeus, os
partidos do chamado socialismo democrático e da social-democracia a aderir
parcialmente ao programa e “a juntar-se” às forças do novo socialismo. E não o
contrário. Julgo que é esta questão que o PCP e alguns sectores do BE, não
percecionam a maior parte das vezes na sua ação tática, porque não reconhecem,
paradoxalmente, que mesmo na derrota e no sofrimento incomensurável, o
movimento popular vai fazendo caminho e aumentando a consciência política “nos
de baixo”, obrigando “os de cima”, instalados à esquerda e à direita do “arco
do poder”, a ceder privilégios para conservar o essencial do sistema,
desvalorizando também os reflexos da luta de classes dentro dos partidos
social-democratas e outros. Esta é uma das origens do radicalismo, ou da
rigidez na tática.
A política do partido Socialista
Francês, do Partido Trabalhista da Grã-Bretanha, do PS em Portugal, do PSOE em
Espanha, liberalizou o mercado, contribuiu para que o sistema financeiro
passasse a controlar a economia e se instalasse nos paraísos fiscais, reduziu o
estado social, apoiou intervenções militares em países soberanos, em nome de
uma terceira via que serviu apenas para degradar a imagem do socialismo e virou
contra ele grandes massas eleitorais. Após as derrotas históricas nestes
países, os seus dirigentes, sem ideologia nem programa alternativos, mas sob
pressão da opinião pública e do movimento popular e das suas bases, viraram-se
para as alternativas políticas e de alianças políticas geradas à sua esquerda,
procurando regressar ao poder, pragmaticamente ou por genuína consciência
reformadora, a vida e a prática nos dirá. E é verdade que esta viragem visa não
só recuperar terreno eleitoral à esquerda, como comprometer e, em última
análise, absorver os novos partidos e movimentos de esquerda.
Podemos observar esta evolução política
na aliança do PS galego com o BNG no governo regional, do PS catalão com a
Esquerda Republicana, mas sobretudo na Alemanha, com acordos parlamentares e de
governo com os Verdes ou mesmo com o Die Link (o partido comunista da RDA
renovado) nos estados alemães onde a CDU conservadora saiu vencida. Estes
dirigentes socialistas (social-democratas), sobre forte pressão das suas bases
e do movimento popular, aceitaram defender as reformas nos costumes
(despenalização do aborto, casamentos homossexuais…) e evoluíram recentemente
para propostas políticas mais globais e reformadoras, como a criação de
eurobonds_obrigações europeias que mutualizam parte da dívida, a obrigação do
BCE de comprar dívida soberana de cada Estado e, até a extinção dos paraísos
fiscais, que FL coloca como objetivo imediato na sua plataforma do “europeísmo
de esquerda”. Propostas aparentemente iguais na forma mas diferentes no
conteúdo? É o que veremos, sobretudo se esses dirigentes forem confrontados com
a pressão do próprio movimento popular.
E também aqui o que conta não é a” nossa”
consciência crítica da inconsequência dos partidos social democratas e do PS
português nestas políticas, mas o modo como elas são percecionadas pela sua
base popular e eleitoral.
As votações em favor da direita em
Portugal como em Espanha e antes na Alemanha e no Reino Unido, evidenciam a
falência da alternativa política da chamada 3ª via, leia-se a política neoliberal
levada à prática pelos “trabalhistas, socialistas e social-democratas”.
Mas hoje e na França a esquerda, em 50
anos, é pela primeira vez maioritária no Senado. Na Alemanha, como na Itália, a
esquerda venceu todas as eleições intercalares. E, de novo em França, 2 milhões
de eleitores, após um vasto e plural debate político que englobou 7 candidatos,
votaram nas primárias socialistas para a escolha do seu candidatado às
presidenciais, votação que foi aberta a filiados e não filiados que tinham de
subscrever um compromisso político e pagar para o efeito um euro!
Analisemos então as propostas do PSF
para a Europa, apresentadas pelo vencedor e agora candidato às presidenciais de
Março de 2012, François Hollande, no documento intitulado “Le Rêve Français”.
Os
eurobonds e a mutualização da dívida contra a especulação financeira :
« Au sein de la zone euro, il s'agira de défendre l'instauration des
euro-obligations qui permettra à l'union monétaire de faire face aux tentatives
de déstabilisation qu'elle subit à travers la spéculation sur les dettes
souveraines des Etats en difficulté. »
A
obrigação do BCE de comprar dívida soberana de cada Estado « Je crois
aussi que le rôle de la BCE comme prêteur en dernier ressort est une nécessité
dans les situations de crises, et je défendrai cette évolution auprès de nos
partenaires européens. »
E até, no que respeita à dívida pública
francesa, que atinge 700.000 milhões e é acompanhada por um deficit da
Segurança Social de 135.000 milhões de euros, a proposta de uma reforma fiscal
que irá incidir sobre a unificação de todos os rendimentos e será progressiva
em relação com os mais elevados, acompanhada por um programa de reequilíbrio da
dívida deferido até 2017, de modo a permitir o crescimento da economia e do
emprego.
« C’est
la raison pour laquelle je propose une réforme fiscale avec un impôt sur le
revenu unifié et progressif qui porte le sacrifice sur ceux qui sont le plus
capables de le supporter : les revenus les plus élevés. »
Finalmente,
e no que respeita às zonas francas e paraísos fiscais, « Une révision de
la fiscalité des territoires sera également introduite et une évaluation
strictes de ces niches fiscales, innombrables et baroques sera effectuée afin
que n’existe plus de refuges pour des privilèges injustifiés. », uma
reforma que conduza ao fim dos seus privilégios.
Este programa será referendado em março
próximo e as sondagens dão-lhe a vitória nas presidenciais francesas. Se os
social-democratas se vêm compelidos a defender hoje o que recusavam à esquerda
apenas há alguns meses, não apenas no governo, mas também na oposição, é porque
as alternativas de esquerda fizeram o seu caminho no movimento popular e no
eleitorado da França.
Mas atenção, há neste discurso uma outra
proposta que procura impor o federalismo orçamental em torno do eixo
franco-alemão e dos países fundadores da União Europeia, agora em nome da
necessidade de construir um programa de crescimento económico e “de transição
ecológica” da economia, contra a recessão e que deixará num segundo círculo de
menor cooperação aqueles outros países que não aceitem as políticas defendidas
por esse primeiro círculo decisor. E ainda a proposta de entregar ao G 20 ( os
20 países mais ricos) e ao FMI a tarefa de regular os desequilíbrios
orçamentais e reformar o sistema monetário internacional, sem mencionar qual
será o conteúdo dessa reforma e identificar a instância internacional que a
regulará, desvalorizando cada vez mais o papel das Nações Unidas.
« Je
préconise une méthode nouvelle avec la distinction de deux cercles
concentriques : les pays fondateurs autour de la France et de l’Allemagne
qui définiront une politique commune et les objectifs à mettre en œuvre et un
second cercle incluant l’ensemble des adhérents qui participeront selon leur
choix aux politiques communes. »
“..
le G20 règlera la question des déséquilibres commerciaux, le FMI devra avoir la
responsabilité de la réforme du système monétaire international, le tout sous
l'autorité d'une instance politique internationale qui prendra la
responsabilité de la résolution de ces questions monétaire, commerciale et
financière. »
As contradições internas do eixo
franco-alemão têm uma base económica real e é ela que determina a política dos
seus líderes: o deficit do comércio exterior francês sobe a 75.000 milhões de
euros, enquanto que a Alemanha apresenta um excedente de 150.00 mil milhões.
Mas a burguesia alemã está prisioneira do seu próprio sucesso: 2/3 das
exportações da Alemanha têm como destino a União Europeia, a sua recessão é o
caminho para a crise alemã. E os bancos alemães são também detentores de uma
boa parte da dívida soberana. Por isso, mesmo na atual conjuntura, tornou-se
realidade mais uma das consignas do programa do europeísmo de esquerda proposto
por FL: a reestruturação, com redução para 50%, da dívida grega!
No entanto, a última cimeira do Conselho
Europeu avisa: “Reiteramos claramente que as decisões adotadas em 21 de Julho e
26/27 de Outubro em relação à dívida grega são únicas e excecionais.”
(Declaração dos Chefes de Estado ou de Governo da Zona Euro. 9/12/2011). Mas os
mercados financeiros voltam a colocar a questão na ordem do dia: Países como
Grécia, Espanha, Portugal e Itália operam no limite insuportável de juros
próximos ou acima de 7% ao ano em títulos de longo prazo. Há três meses, esses
juros não passavam, em média, de 4%. O banco britânico Barclays Capital estima
que seja necessário um programa de resgate somente para as economias italiana e
espanhola, no valor entre € 500 mil milhões e € 800 mil milhões para os
próximos 24 meses, muito mais do que dispõe o FEEF_MEE, Fundo Europeu de
Estabilidade Financeira (FEEF) e Mecanismo Europeu de Estabilidade (MEE), 500
mil milhões de euros (670 mil milhões de USD).
Vejamos agora, o que aconteceu na
Convenção do SPD alemão do passado 5 de Dezembro, já que foi este partido, sob
a liderança de Scröder, que levou mais longe a conversão dos partidos
social-democratas em partidos ao serviço das políticas neoliberais, no caso da
Alemanha, em coligação governamental com a conservadora CDU, num processo
político que FL classificou e bem, como “A política que dirige a Europa é
autoritária mas consensual entre a direita e a social-democracia”. E, que nos
interessa particularmente, porque a matriz original e o financiamento e suporte
político do PS português, é o SPD e a criatura transporta sempre a marca do seu
criador.
A figura central do congresso foi o
velho líder da esquerda social-democrata e antigo chanceler Helmut Schmidt,
opondo-se à austeridade e ao diktat da CDU sobre os países europeus,
preconizando ao contrário uma política comum de crescimento e de criação de
emprego. “We Germans
cannot force our economic or social model on to European partners as model or
benchmark, merely offer it as one example among many realities. Without growth
and new jobs no state can reorganize its budget.”
O líder parlamentar Steinmeier, que
apresentou a moção sobre política europeia, defendeu a o recurso aos Eurobonds
antes de 2013, através do Fundo de Resgate Europeu ( mil milhões de Euros),
classificando-os como o núcleo criador do Fundo Monetário Europeu. Defendeu a
criação de uma taxa sobre as transações financeiras europeias, para aplicar em
medidas anti recessivas, e a harmonização de taxas, contra a “tax dumping”. que
podemos enquadrar na linha de outra proposta de FL, sobre “A criação de
regras fiscais comuns como uma taxa mínima para o IRC, para evitar a
concorrência fiscal entre Estados”. Sigmar Gabriel, atual líder
do SPD e protegido do direitista Shcröder, avalizou esta viragem à esquerda.
Mas as eleições federais estão agendadas apenas para 2013!
O Partido Trabalhista inglês, berço da
3ª via, parece ser aquele que mais resiste a uma viragem tática. Mas, sobretudo
ele, não pode ficar indiferente aos mais de dois milhões de ingleses que saíram
às ruas na quarta-feira 30 no Reino Unido, contra o aumento das contribuições
para a previdência.
Não está nas nossas mãos prever
mecanicamente ou evitar o caminho Federalista da Europa. A rigidez de posições
nesta matéria poderá conduzir a novas oscilações táticas e à desorientação da
base de apoio do Bloco. É preciso deixar claro quais são os conteúdos políticos
federalizantes que a esquerda não pode aceitar e, se esse for o caminho objetivo,
que a correlação de forças na Europa imponha, defender as alternativas que
possam reforçar os direitos democráticos dos cidadãos e das nações. E é esse o
sentido geral da tática imediata proposta por FL.
A luta contra o acordo imposto pelos
conservadores alemães, é o combate contra um federalismo fiscal que destrói a
independência do estado nação, porque passa a decidir sobre o seu orçamento,
que é a base da ação política autónoma do seu governo democrático, esvaziando
uma conquista civilizacional secular. Constitui uma nova tarefa de frente
ampla, capaz de promover um combate mobilizador de todas as forças populares e
democráticas.
A tática do PCP
Mas voltemos a ação tática, agora para
analisar em paralelo a conduta política do PCP: Na sua crítica justa às
políticas direitistas do PS, aquele partido tem demonstrado uma grande
incapacidade para captar a simpatia das suas bases populares. Tal fica a
dever-se, na minha opinião, a uma tática rígida que trata o PS em muitos
contextos políticos como inimigo principal, não considerando relevantes as suas
contradições com os partidos de direita e as suas contradições internas, a luta
de classes dentro do PS, que fez emergir no passado movimentos políticos como o
de Lopes Cardoso (Para as legislativas de 1980, Mário Soares, na tentativa de
derrotar a AD, fez uma coligação com a U.E.D.S. de Lopes Cardoso e com a ASDI,
a Frente Republicana Socialista. Não resultou e a AD de Sá Carneiro e Freitas
do Amaral voltou a ganhar com maioria absoluta. Lopes Cardoso e os seus
camaradas da U.E.D.S., voltaram ao PS e nunca mais se manifestaram mais à
esquerda) e candidaturas presidenciais como a de Manuel Alegre.
Mas essa impotência política também se
deve à incapacidade para apresentar uma alternativa de poder e de programa de
governo para a nossa democracia constitucional e para elaborar um novo programa
de transição para o socialismo, vitorioso que foi na Revolução Democrática de
74/75, mas também esgotado, o programa elaborado por Álvaro Cunhal em 1964, “Rumo
à Vitória, As Tarefas do partido na Revolução Democrática”.
Finalmente, e não menos importante, as
alternativas e propostas políticas parciais do PCP não chegam à opinião
pública, e, pelo contrário, são muitas vezes deturpadas; não me recordo de ver no
Expresso, em 50 anos, um único artigo que transcrevesse fielmente as posições
do PCP ou emitisse uma opinião que lhe fosse favorável. Uma discriminação que,
receio, atinja também e cada vez mais o BE.
A necessidade de uma tática de frente
ampla
Seria interessante perceber porque é que
o Bloco foi, em eleições anteriores, capaz de captar também votos de eleitores
tradicionais do PSD e CDS, e de abstencionistas, agora perdidos.
A estreiteza na tática da esquerda e o
seu sectarismo não se manifesta apenas na incapacidade para valorizar na ação
política e na política de alianças as posições políticas comuns, mesmo que
pontuais ou de menor relevância; é ainda mais grave na incapacidade histórica
para disputar o apoio político de grandes massas populares que a direita
consegue manter sob seu controle político e constituem a sua base de apoio
eleitoral. E, no entanto, ficou provado que batalhas políticas e eleitorais,
como o movimento gerado em torno da libertação dos presos políticos
antifascistas em greve de fome, coordenada pela Comissão de Solidariedade_CSPA,
como a da primeira conquista da Câmara de Lisboa à coligação de direita ou,
anteriormente, a candidatura independente de Lurdes Pintassilgo às
presidenciais, tal como os votos no Bloco provenientes de abstencionistas e
votantes em branco, novos eleitores e mesmo votantes tradicionais da direita,
representaram alternativas de esquerda que encontraram apoio mais amplo em
novos sectores populares.
É para responder a esta questão, que se
torna necessário abrir outras frentes de trabalho, para além do europeísmo de
esquerda, da luta contra a dívida odiosa, do desenvolvimento sustentado e pelo
emprego, enfrentando problemas que têm de receber uma nova atenção política da
parte dos dirigentes de todos os partidos de esquerda.
Se o Bloco, na sua fase de ascensão
política, falou sobretudo às minorias marginalizadas, que fale agora às
maiorias marginalizadas pela crise financeira e pela política neocolonial da
troika.
A renegociação da dívida das famílias e
empresas em risco de insolvência, tem de passar para o primeiro plano das
propostas e da ação política!
Uma terceira frente de batalha política
É hora de abrir uma terceira frente de
batalha política, com questões de importância nacional e europeia, “fraturantes”
porque confrontam políticas, menos evidentes, mas que são de facto movidas
pelos interesses do capital financeiro e consequência da sua natureza
antidemocrática, soluções políticas novas que são indispensáveis para construir
uma alternativa global à esquerda,
_Como a renegociação da dívida das
famílias insolventes, sobretudo em defesa da habitação familiar, com o apoio da
banca pública e privada. Essa renegociação deverá assentar na amnistia da
dívida ao fisco e à segurança social ( quando coexistir) em 50% e das coimas
fiscais e juros em 100 %, estabelecendo prazos mais alargados para o restante
pagamento. E no que respeita ao crédito à habitação, na redução de 50% da
dívida contratada à banca e na ampliação do seu prazo de pagamento sem juros.
_como a renegociação da dívida das
empresas em risco de insolvência “fortuita” (sem dolo jurídico), em defesa do
emprego, com amnistia de 50% das dívidas à Segurança Social e às Finanças,
perdão das coimas fiscais e juros devidos, e prazos dilatados de pagamento.
_Como a promoção do movimento
cooperativo de produção, comercialização e consumo, apoiado na banca pública e
privada, como forma de organização coletiva para acesso ao crédito e para a
produção, comercialização ( e exportação) e aquisição de bens sociais e de
produtos nacionais de substituição das exportações.
_ Como o futuro demográfico de Portugal
(menos 1 milhão de jovens e mais 900.000 idosos, no censo de 2011), a previsão
da queda da nação para 7,5 milhões de habitantes num prazo de apenas algumas dezenas
de anos, num país que não será para velhos nem para novos e a construção e
liderança de um projeto capaz de obter o mais amplo consenso nacional para
suster e resolver este problema, que é de sobrevivência nacional!?
_A democratização da justiça e a
racionalização e qualificação do Serviço Nacional de Saúde e da Escola Pública.
(Na saúde como na educação, o Bloco tem políticas e alternativas estruturadas e
respeitadas, sobretudo na primeira, embora pouco divulgadas).
_A salvaguarda da Segurança Social,
sobretudo do sistema universal de pensões de invalidez e de reforma e o seu
reequilíbrio em favor das pensões mais baixas
_A democratização das forças armadas e
militarizadas e a redefinição da sua missão nacional orientada estrategicamente
para evitar a guerra e proteger a soberania nacional, para a Defesa Civil (
onde se insere não apenas o enfrentar das catástrofes humanitárias, mas também
o combate aos incêndios, apoio às forças de segurança no combate ao crime organizado
e o combate contra o terrorismo) e para as tarefas de pacificação e resgate dos
conflitos internacional, estendendo esta cultura às forças policiais e a todo o
aparelho repressivo do estado
_O relançamento do movimento pela Paz
mundial sob a consigna de destruição e proibição de todo o arsenal atómico e
químico mundial, mais ampla e mais importante que a mera dissolução da NATO
_ A superação do deficit externo, origem
estrutural da dívida soberana,no quadro de retoma do Plano Estratégico para os
Oceanos, território marítimo que é a última reserva da riqueza nacional e cuja
soberania a UE reclama, mas a quem reconhece a necessidade de uma nova gestão
integrada e ambiental
e da luta contra o ermamento do mundo
rural, questão ambiental de suma importância,
Questões políticas que estão para além
da querela eleitoral e precisam de ser abordadas na perspetiva de um programa e
de um governo democrático de esquerda. Algumas delas suscetíveis de serem
usadas de imediato ma luta política de massas e na ação legislativa
parlamentar.
E volto a questionar-me: O movimento é
tudo, a alternativa de poder, nada? Não está claro, neste problema crucial, o
pensamento político de FL.
FL escreve: “A greve geral que foi
hoje convocada é uma boa prova provada desta política. Ela não tem como objetivo
qualquer sonho do Estado Europeu, nem muito menos a exigência da saída do euro.
Nem podia, pois não? Tem a plataforma correta que junta mais gente, a da
rejeição dos cortes dos subsídios ou dos aumentos dos impostos, a defesa do
salário e de uma política de emprego. Chama-se resistência e responde pelo país
– é a luta pela hegemonia e cria ação social. É nessa ação que se aprende e que
se erguem alternativas. Como dizia alguém, é sempre da prática que vêm as
ideias justas. Vamos à luta.”
O PS, sem a ação política independente
dos partidos à sua esquerda, jamais se renovará, mas, a flutuação política da
sua base popular nos últimos anos, parece indicar que só o confronto provocado
pelo exercício do poder, no quadro de um programa independente apresentado “em
baixo” mas também negociado “ em cima “ à sua esquerda, nas condições atuais do
país e da Europa, conduzirá à diferenciação política das suas tendências. Isso
foi visível quer na transferência inicial de votos para o BE, quer no peso que
Alegre teve ao confrontar Sócrates internamente e nas primeiras eleições
presidenciais a que concorreu.
Mas um governo democrático de esquerda,
se realizável no atual horizonte político e eleitoral, assentará provavelmente
num PS ainda hegemónico e numa aliança política mais ampla (questão que não se
deve confundir com o governo de coligação) com o PCP e o Bloco de Esquerda, ou
mesmo com novos partidos e movimentos políticos heterodoxos que a crise e a
revolução democrática contemporâneas fazem nascer, e tenderá a ser socialmente
alargada ao movimento sindical, cooperativo (que é uma alternativa para
resistir à crise), de desempregados e precários, às instituições de
solidariedade social, autarquias e entidades de administração regional e, incontornavelmente,
ao mundo empresarial e financeiro.
Identificado a principal ameaça à
democracia e ao socialismo, como refere Louçã, “ …o sector da burguesia que tem
dominado os governos do PS e do PSD-CDS é o que produz bens não-transacionáveis,
e que por isso coloniza o Estado para garantir o apoio à banca, aos empresários
das obras públicas, da especulação imobiliária, das grandes superfícies, dos
casinos, dos monopólios naturais, da energia e das comunicações. É o capital
financeiro.”
A esquerda, quando e se sair vencedora
da luta democrática pelo poder, não terá nem os quadros, nem os recursos
financeiros, nem a solidariedade europeia e internacional das forças
progressistas, suficiente para realizar o seu programa de defesa e
aprofundamento da democracia política, económica, social e ambiental.
Terá então de incluir num compromisso
civilizacional, ou, em linguagem mais política, num programa de frente ampla,
não apenas a grande maioria dos pequenos e médios empresários, proprietários e
investidores, que constituem o tecido empresarial do país e estão situados nos
sectores em crise da construção civil, comércio, turismo e produção alimentar,
carteiras de investimento e poupança, mas estender-se à banca e às grandes
empresas ( ainda haverá bancos e grandes empresas “nacionais”?) que aceitem o
seu programa de criação de emprego, riqueza nacional e desenvolvimento
sustentável do país.
Os partidos de esquerda têm de elaborar
a tática e uma estratégia que lhes permita enfrentar a catástrofe iminente, em
qualquer correlação de forças.
O BE e todos os partidos de esquerda,
falam em primeiro lugar para o movimento popular. Mas precisam de falar claro
uns com os outros:
Se a ofensiva da direita tiver sucesso,
ela chegará até à subversão dos direitos democráticos fundamentais da
Constituição e ao governo musculado.
Se a resistência popular tiver sucesso,
ela tem que se materializar num governo que aceite e realize um programa mínimo
de esquerda, que terá de reconstruir não só um estado reduzido à miséria, mas
também uma nação empobrecida. E esta tarefa, atravessará gerações e custará
rios de suor e lágrimas e, esperamos, mais nenhum sangue.
22 de Dezembro de 2011
António dos Santos Queirós_ Não filiado
no Bloco
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