21.11.15

As causas políticas da guerra e do terrorismo nos países árabes e na Europa



Devemos chorar todos os nossos mortos, cristãos e muçulmanos, xiitas e sunitas, vítimas inocentes da guerra e do terrorismo e, para além do luto e das medidas antiterroristas, procurar as suas causas políticas.

A invasão do Afeganistão, liderada pelos EUA com a contribuição militar da organização armada muçulmana Aliança do Norte e de outros países ocidentais (Reino Unido, França, Canadá e outros 47 países, NATO-ISAF), teve início em 7 de outubro de 2001, à revelia das Nações Unidas, que não autorizaram a invasão do país, sob o signo da “ guerra contra o terrorismo”, declarada pelo governo Bush, após os atentados de 11 de setembro.
A invasão do Iraque  pela coligação EUA-UK-NATO em 2003 precedeu o terrorismo do DAESH (ISIS).
A guerra na Síria, já em 2011 e em plena Primavera Árabe,  desencadeou-se quando esta organização terrorista ainda estava confinada ao Iraque.
A revolução democrática na Tunísia e no Egito, conhecida como Primavera Árabe, foi seguida em 13 de fevereiro de 2011 pelas manifestações populares na  Líbia, mas rapidamente degenerou em confronto militar, com intervenção da NATO e dos seus aliados. O DAESH chegaria então à Líbia. entre duas guerras civis sem fim à vista.
Afeganistão, a invasão e ocupação
Um relatório intitulado Body Count elaborado pela Physicians for Social Responsibility, Physicians for Global Survival e pela organização Médicos Internacionais para a Prevenção da Guerra Nuclear (galardoada com o Prémio Nobel da Paz) concluiu que 106.000 a 170.000 civis foram mortos como resultado dos combates no Afeganistão.
A maioria dos soldados da coligação que morreram no Afeganistão é norte-americana, com 2.097 mortos nos primeiros nove anos de guerra. Aí também perderam a vida militares portugueses.
A administração Bush assumiu que os membros da Al-Qaeda capturados no campo de batalha não seriam protegidos pela Convenção de Genebra, uma vez que não se tratava de uma guerra convencional e transformou a base militar de Guantánamo, que os EUA mantêm em Cuba com a oposição do seu governo, num centro de tortura desses prisioneiros, que se conserva até à atualidade.
Os bombardeamentos que atingiram alvos civis, como recentemente o hospital dos médicos sem fronteiras, grupos de civis e a exibição nas redes sociais de filmes dos talibãs mortos profanados por soldados da coligação, causaram ondas de revolta e ódio no mundo muçulmano.
Desde 2001, mais de 5,7 milhões de afegãos regressaram ao país, mas outros 2,2 milhões permaneciam refugiados em 2013, sobretudo no Paquistão. Após a retirada das principais forças estrangeiras em 2014 e apesar das negociações secretas com os talibãs, intensificaram-se os confrontos militares, atentados bombistas, a utilização de drones e operações de tropas especiais para liquidar os líderes da guerrilha e o próprio Ossama, provocando nova vaga de refugiados que começaram a chegar à Europa.
No auge da presença americana no Afeganistão, o ano fiscal de 2011, os custos da guerra elevavam-se a  468 biliões de dólares,  uma estimativa em que os gastos com a presença de um único soldado dos Estados Unidos no Afeganistão ultrapassava o valor astronómico de 1 milhão de dólares por ano!
Iraque, a invasão e ocupação
Cerca de meio milhão de pessoas morreram no Iraque desde a invasão da coligação liderada pelas forças norte-americanas  até ao fim da ocupação em 2011, revelou um estudo académico realizado por investigadores universitários dos Estados Unidos, Canadá e da capital iraquiana, coordenado por Amy Hagopian, investigadora de saúde pública na Universidade de Washington.
A última estimativa de Bagdad, em cooperação com o Ministério da Saúde do Iraque, abrange não só as mortes violentas, mas outras mortes evitáveis relacionadas com a intervenção militar, guerrilha e colapso social subsequente. "A violência no Iraque causou a maioria das mortes, mas cerca de um terço  foi indiretamente ligado à guerra. Essas mortes foram deixadas de fora das contagens anteriores", disse a principal autora do estudo.
A imagem política das democracias ocidentais, particularmente da coligação militar liderada  pelos Estados Unidos, que incluía forças inglesas, apoiadas por pequenos contingentes da Austrália, da Dinamarca e da Polônia  ( a que se associaria mais tarde um pequeno grupo de forças militarizadas portuguesas), face à inexistência de armas de destruição em massa no Iraque e de qualquer  ligação entre Saddam Hussein e a Al-Qaeda, aos custos econômicos, ao número de vítimas dos dois campos, a execução sumária de Sadan Hussein, a tortura de prisioneiros em Abu Ghraib, aos escândalos com firmas de segurança privada, como a Blackwater, bem como à estruturação dos primeiros governos pró-americanos, numa base étnico-religiosa xiita, conduziu à constituição de grupos de resistência armada de diversas tendências políticas, nacionalistas (os Fedayin e os militantes do partido socialista árabe Baath) e islamistas ( o Exército Mahdi, também xiita, chegou a ter 60.000 milicianos e hoje combate o DAESH), mas com a crescente hegemonia de forças extremistas ligadas à Al Qaeda e à sua cisão no DAESH. Com a ocupação e o emergir da guerra civil, 15% da população fugiu para países vizinhos, contabilizando-se 4 milhões de refugiados iraquianos.
No princípio de 2003, os Estados Unidos, o Reino Unido e a Espanha propuseram a chamada "Resolução 18" para dar ao Iraque um prazo para cumprir as resoluções anteriores e que seria aplicada pela ameaça de acção militar. Esta resolução foi retirada por falta de apoio no Conselho de Segurança das Nações Unidas. Em particular a França e a Alemanha, membros da NATO, e a Rússia, opuseram-se à doutrina Bush da "guerra preventiva" e a uma intervenção militar no Iraque devido ao elevado risco para a segurança da comunidade internacional e defenderam o desarmamento através da diplomacia. Kofi Annan, Secretário Geral da ONU, diria depois sobre a invasão: " em conformidade com a Carta das Nações Unidas a invasão do Iraque foi ilegal".36 milhões de pessoas em todo o mundo tomaram parte em cerca de 3000 protestos contra a guerra do Iraque.
Estima-se que durante os dez anos de ocupação mais de um milhão de soldados norte-americanos foram enviados para o Iraque: 4.483 foram mortos, 33 mil feridos e mais de 200 mil diagnosticados com transtorno de stresse pós-traumático. A taxa de suicídio alcança 26% entre os veteranos masculinos de 18 a 29 anos.
No que se refere aos custos económicos da guerra, os valores são assustadoras. Segundo J. Stiglitz (Premio Nobel de economia) atinge os 4 triliões de dólares. A Dívida dos EUA subiu de $ 6,4 triliões em março de 2003 para US$ 10 triliões em 2008 (antes da crise financeira), sendo que pelo menos 25% de montante é diretamente atribuível à guerra.
Mas do ponto de vista do setor privado, a Guerra do Iraque trouxe um saldo extremamente positivo para o complexo industrial-militar, os serviços de segurança privada e para as empresas de construção civil que receberam os contratos de  reconstrução das suas infraestruturas, bem como, para a própria indústria petrolífera, que passou por um período de pico nos preços, um aumento do preço do barril de petróleo em quase quatro vezes entre 2003 e 2011.
Em 2003, quando os EUA chegaram à região, o preço do barril rondava os US$25. Cinco anos depois, em 2008, os preços chegaram a US$ 140. A Guerra contra o Terror conduzida pelos EUA, após 2001, propiciou ainda um aumento considerável na venda de armas para os países em todo o mundo. As 100 maiores empresas produtoras de armas do mundo venderam US$ 410 biliões em armas e serviços militares em 2011. Um estudo do Sipri mostra que a despesa militar no mundo, em 2011, foi de 1,6 triliões de dólares, um aumento de 40% em 10 anos.
A maior parte dos recursos foi alocada na contratação de empresas privadas de segurança. Em 2008, os dez principais fornecedores de serviços militares receberam cerca de US$150 biliões em contratos.
Para perpetuar este ciclo, altamente lucrativo, essas corporações  reinvestem parte dos biliões de dólares adquiridos com a guerra em ações de lobby e contratação de antigos oficiais de topo para a sua administração, como facilitadores do processo de contratação. A Lockheed Martin, empresa que mais possui contratos na área de segurança militar, em todo o mundo, doou mais de um milhão de dólares para deputados e senadores de diferentes partidos em 2009. A sua direção é composta por antigos funcionários do governo: o ex-vice-secretário de Defesa, o ex-comandante do Comando Estratégico, o ex-vice-secretário de Segurança Interna. O seu rendimento anual é de US$ 40 biliões de dólares, dos quais, pelo menos 35 biliões, são provenientes de contratos com o governo norte-americano. Mas a Lockheed Martin não é exceção: agem do mesmo modo a Northrop Grumman, Boeing, CACI, Parsons Corp e a Pasadena.
A Organização das Nações Unidas (ONU) informou  recentemente que 1,2 milhão de iraquianos tiveram de abandonar os seus lares desde o início dos conflitos provocados pelo avanço do DAESH
Síria, a intervenção estrangeira
A primeira vaga da revolução democrática nos países árabes apanhou de surpresa as potências mundiais.
A sua riqueza em petróleo, gaz natural, minerais e reservas financeiras, partilhada entre as oligarquias locais e as grandes empresas e consórcios financeiros, do ocidente e do leste, chocava com um grande movimento popular de revolta, que exigia liberdade política, pão e progresso social. Uma profunda inquietação invadiu então o mundo dos negócios e das finanças. Os seus porta-vozes políticos e da comunicação social começaram por lançar a suspeição acerca do fundamentalismo religiosa que estaria a guiar a revolução e, quando se tornou irreversível a queda dos regimes autoritários da Tunísia e do Egito, declararam o seu apoio à transição para um modelo de democracia liberal.
Mas, em paralelo, procuraram suster e limitar a vaga revolucionária: a Arábia Saudita, o Koweit, Qatar ou os Emiratos Árabes, regimes autocráticos, foram considerados intocáveis, tal como o Bahrein, o pequeno estado com a maior base americana do médio oriente, invadido pelo exército dos cheques feudais sauditas, a revolta popular sufocada em sangue e em silêncio cúmplice ocidental. A Rússia, que dispõe na Síria da única base naval na região, adotou a mesma política face ao seu regime.
Mas as primeiras manifestações de protesto do povo líbio e a violência da resposta do regime autoritário de Kadhafi permitiram ensaiar uma nova estratégia, a militarização da revolta popular: intervenção política, económica e mediática levada até ao extremo da guerra civil, seguida de escalada militar. Na Líbia, esta nova estratégia foi liderada no terreno pela Nato e pela França, com o objetivo de colocar no poder uma nova fação favorável aos seus interesses e renegociar a gestão das suas riquezas.
O fracasso da ação mediadora das Nações Unidas e de Kofi Annan na Síria, insere-se numa estratégia de guerra civil e intervenção militar estrangeira, a princípio encoberta e depois direta. A posição da China, que apoiava este plano e se afirmava contra a intromissão nos assuntos internos da nação Síria e em favor de uma solução política negociada, foi deliberadamente confundida com a da Rússia, potência aliada do regime. O governo tirânico de Damasco diabolizado e acusado de crimes de guerra contra os civis, mas como se não houvesse civis em ambos os campos e atrocidades comuns. Os dignatários do regime de Assad que desertam passam de imediato ao estatuto de defensores da democracia e dos direitos humanos. O cenário político e mediático segue o modelo da Líbia.
O Conselho Nacional Sírio_CNS, foi criado em outubro de 2011 por representantes da Irmandade Muçulmana, dos Comitês Locais de Coordenação que lideraram as manifestações, por liberais e também por partidos das minorias curdas e assíria, compostos principalmente por exilados políticos, contando com o apoio do governo da Turquia, onde se encontra instalado, da Arábia Saudita, do Qatar, dos Emiratos Árabes e das potências ocidentais. Ele não representa no entanto a totalidade da oposição síria, não integrando o Fórum Democrático, particularmente as personalidades e movimentos de esquerda.
A sua estratégia foi o apelo à solução militar e à intervenção armada da Liga Árabe, do ocidente e dos EUA.
O porta-voz do Conselho Nacional Sírio (CNS), George Sabra, deu uma conferência de imprensa em Istambul ( Março de 2012) afirmando: “Pedimos uma intervenção militar dos países árabes e ocidentais para proteger os civis”. Sabra anunciou que foi estabelecido um gabinete de coordenação para encaminhar armas para o Exército Livre. Disse que isso será feito com o apoio de governos estrangeiros. O CNS rejeitou o plano de paz das Nações Unidas, baseado no cessar-fogo e nas negociações políticas para uma solução pacífica e política do conflito.
A guerra na Síria já provocou mais de 230.000 mortes. O número de refugiados sírios ultrapassou a barreira dos quatro milhões. O balanço é feito pela ONU que alerta para o facto de nem todas as pessoas em fuga estarem registadas.  A guerra na Síria provocou, ainda, mais de seis milhões de deslocados. Feitas as contas, cerca de metade da população foi obrigada a fugir.
Segundo a Amnistia Internacional, 95% dos refugiados sírios estão em apenas cinco países: Turquia, Líbano, Jordânia, Iraque e Egito. A Turquia, com 1,6 milhão de refugiados sírios, e o Líbano, com 1,1 milhão, são os principais destinos. Cinco países ricos do Golfo,  Catar, Emirados Árabes, Arábia Saudita, Kuwait e Bahrein exigem um visto prévio de entrada, muito difícil de conseguir. No entanto, fazem parte da coligação que promoveu a militarização da primavera árabe na Síria e financia os grupo armados da oposição.
Líbia, a intervenção estrangeira
No final da primeira guerra civil e da intervenção estrangeira, da NATO, liderada pela França e pelos  seus aliados,  que foram muito para além do  mandato da ONU, o número de mortos na Líbia era estimado em pelo menos 30.000 e o número de feridos em pelo menos 50.000, sendo 20.000 com ferimentos considerados graves. De entre os mortos pelo menos metade seria de combatentes do regime deposto de Kadhafy.
Em fevereiro de 2015, os danos e a desordem causados pela segunda guerra civil fizeram cair a produção de petróleo de 1,4 milhões de barris por dia em maio de 2013 para 300.000 barris por dia em janeiro de 2015, com uma perda de receita de 90%.
Mais de 3.000 pessoas morreram por causa dos combates, há 400.000 pessoas deslocadas no interior do país e uma nova onda de refugiados de nacionalidade líbia chega à Tunísia e tenta alcançar a Europa pelo Mediterrânio.
Acresce que mais de 90% dos refugiados e migrantes que chegam à costa italiana passam pela Líbia, agora um “Estado-fantasma” dividido entre dois “governos” rivais (e dois parlamentos), um em Tripoli outro em Tobruk. O Egipto, os Emirados e os sauditas apoiam Tobruk, tal como Paris. Tripoli tem a ajuda do Qatar e da Turquia e de Roma. As companhias petrolíferas da França e da Itália, as suas empresas de construção disputam o mercado líbio e  os terroristas do Daesh conquistam pelas armas o seu próprio território. Tal como a Al Qaeda, desde o princípio da intervenção estrangeira que foram tolerados e integrados na coligação anti-Kadaphy.
À Líbia chegam os refugiados que fogem da Nigéria e do Boko Haram. Da República Centro-Africana e do Mali. Da Somália, em guerra civil desde 1994, da Eritreia, do Sudão (governado pelo general Omar al-Bashir que tem um mandato de captura internacional) e do Sudão do Sul, onde não há paz. O regime laico de Kadhafy era o pêndulo que equilibrava estrategicamente este fluxo e a única força militar no terreno capaz de se opor ao fundamentalismo islâmico. A NATO recusou todas as propostas de solução política para a guerra civil, aceites por Kadhafy, viessem de Chavez, da Liga Árabe ou da União Africana e dos BRICS.
Os golpes de estado na Argélia e no Egito
Os movimentos políticos de influência islamita que escolheram a via democrática ocidental, como a a Frente Islâmica de Salvação que em 2001 ganhou a primeira volta das eleições legislativas na Argélia, foram vítimas de golpes de estado apoiados pelas potências ocidentais; neste país, a seguir ao cancelamento da segunda volta eleitoral, a FIS sofreu brutal repressão. Após a proibição da FIS e a detenção de milhares de seus membros, os seus apoiantes começaram uma guerra de guerrilha contra o governo que provocou 150 mil e 200 mil mortos: apesar da derrota das forças principais da guerrilha, em 2002, ainda hoje se mantém um conflito armado de baixa intensidade conduzido pelo Grupo Salafista para a Pregação e o Combate (GSPC), que, entretanto, declarou o seu apoio à Al-Qaeda.
Nas primeiras eleições parlamentares no Egito após a queda de Mubarak, em 2011, o Partido Liberdade e Justiça, PLJ, nascido da moderada  Irmandade Muçulmana,  ganhou quase metade dos assentos na Assembleia do Povo, enquanto, o também islâmico-salafista, Partido Nour ficou em segundo lugar, o que deu aos islâmicos cerca de 70% dos assentos na Câmara Baixa e um resultado semelhante na escolha dos integrantes da Câmara Alta (Conselho Shura). Em 2012, Mohammed Morsi, presidente do PLJ, venceu as primeiras eleições presidenciais democráticas no Egito. Com 51% dos votos na segunda volta, derrotou Ahmed Shafiq, ex-comandante da Força Aérea. Morsi procurou tranquilizar os adversários, declarando que, como presidente, queria construir um "Estado democrático, civil e moderno" que garantisse a liberdade de religião e o direito de protesto pacífico. O referendo da nova constituição voltou a conceder ao PLJ a maioria dos votos. Em 2013, no Egipto, um outro golpe de estado  conduzido pelos militares afastou do poder e ilegalizou o PLJ, prendeu e reprimiu os seus membros, condenando à morte os seus líderes, de novo com a cumplicidade das potências ocidentais. Assim, estendeu a influência da Al Qaeda e do Daesh à península do Sinai e ao território deste país.
Em paralelo, o arrastamento do conflito israelo-palestino, a progressão ilegal dos colonatos e as violentas incursões da máquina de guerra judaica, radicalizaram os movimentos políticos palestinianos e serviram igualmente de bandeira de recrutamento ao DAESH. Apesar  de tudo, as organizações políticas palestinas condenaram sem reservas o terrorismo do DAESH e opuseram-lhe uma barreira eficaz à sua penetração entre a nação da Palestina e a sua diáspora.
O financiamento do DAESH
O encontro dos "Amigos do povo da Síria", realizado em Abril de 2012, na Turquia, juntou representantes diplomáticos de cerca de 70 países ocidentais e árabes, onde se proclamou o CNS Conselho Nacional Sírio como o legítimo representante da Síria. O Conselho Nacional Sírio garantiu nessa altura os salários para todos os rebeldes que combatam o regime do Presidente Bashar Al-Assad. Entre eles já se encontravam os grupos ligados à Al Qaeda e ao DAESH. Os militares desertores também seriam pagos, com milhões de dólares doados por vários países do Golfo Pérsico. Ausências relevantes foram as da Rússia, China e Irão, que em Teerão realizaram uma outra Conferência internacional.
A Conferência Nacionalista Árabe, reunida em Junho desse ano na Tunísia, envolvendo os partidos nacionalistas e laicos nasseristas ou “bassitas”, e outros de esquerda, defendeu a solução política não militar, mas não mereceu qualquer apoio das potências ocidentais.
No dia 2 de Setembro de 2014, a representante da União Europeia (UE) no Iraque, Jana Hybášková, disse no Parlamento Europeu que alguns países da UE estavam a comprar petróleo ao DAESH através da Turquia. Bruxelas negou mas avançou ter provas de que esse comércio estaria nas mãos de rotas clandestinas controladas por empresários turcos, iranianos e curdos iraquianos. Os Estados Unidos, por seu lado, alegam que o petróleo segue para a Turquia, Jordânia e Arábia Saudita –também acusada, com o Qatar e os Emiratos  de financiar diretamente os sunitas radicais, na guerra e na propaganda feita a partir da criação de pseudo escolas  corânicas a ocidente. Segundo a imprensa internacional, o ‘desconto’ praticado pelo EI pode chegar aos 60% e o lucro obtido ultrapassa os 2 milhões de dólares por dia.
Para além de petróleo, o DAESH drena para os mercados internacionais ópio, arte (que rouba dos campos arqueológicos que também controla e que vai destruindo), fosfatos, gás natural, cimento, trigo e cevada – este agregado pesa um pouco mais que o petróleo no seu orçamento.
Nos territórios ocupados saqueia ( dos bancos de Mossul terá retirado 498 milhões de dólares) e impõe impostos de guerra e, com a economia desagregada e os serviços sociais destruídos, pratica uma política de distribuição de bens e serviços básicos às populações civis, que dele dependem para a sobrevivência quotidiana.
O porto turco de Ceyhan é o centro deste mercado negro. O petróleo chega do território conquistado pelo DAESH em longos e regulares comboios de camiões. Mas foi preciso o último ataque terrorista em Paris para que a aviação americana atacasse pela primeira vez esse alvo. A ofensiva aérea russa intensificou-se então, atacando em força as instalações petrolífera, reservatórios e comboios do DAESH.
Ao mesmo tempo, as principais potências ocidentais, o Irão e a Rússia, acordavam finalmente na abertura de uma via negocial para uma solução política da guerra civil na Síria, que inclua o seu atual presidente neste processo, apesar da insistência no seu afastamento posterior.
A Europa numa nova situação de “guerra de baixa intensidade”
Este balanço incompleto e sumário permite perceber que as principais vítimas desta vaga de invasões e terrorismo foram e são, em primeiro lugar, os povos e as nações muçulmanas e percecionar como a violência, o sofrimento e o luto atingiram esse outro lado da humanidade, semeando o terreno para o desespero de grandes massas populares, revoltadas, gerando milhões de refugiados e migrantes,  favorecendo a propaganda fundamentalista. E desacreditaram a opção democrática proclamada a ocidente.
A Primavera Árabe  de 2010 e 2011 inaugurou o período das revoluções democráticas no norte da África e nos países árabes, retomando, mais de meio século depois, o programa incumprido dos jovens oficiais nacionalistas que na década de 50 do século XX enfrentaram as potências neocoloniais vencedoras da II guerra Mundial e os seus aliados monárquicos e feudais; fundando então os primeiros partidos democráticos, socialistas e comunistas no mundo árabe, nacionalizando o petróleo, o gaz, as empresas mineiras e o Canal do Suez e prometendo aos seus povos o pão, a liberdade e a independência.
O avanço espontâneo da revolução democrática na Tunísia como no Egipto no século XXI, continha desde logo uma lição de ciência e de ética políticas:
A democracia não se exporta e impõe com exércitos de ocupação, como aconteceu no Iraque e no Afeganistão. Os povos árabes têm dentro de si a força e a capacidade de lutar pelas suas reivindicações políticas fundamentais e vencer o terrorismo na sua origem.
A revolução democrática dos povos árabes foi truncada pela sua militarização: o resultado é que a Europa está hoje numa situação de “guerra de baixa intensidade” e todas as guerras, exigem uma solução política.
Os refugiados (4 milhões de refugiados iraquianos; 4 milhões de refugiados sírios; mais de 2,2 milhões de refugiados afegãos; quantos milhões, provenientes da Líbia e da África do norte e central?) e migrantes são-o, afinal, de uma guerra que também foi provocada e alimentada por alguns dos governos conservadores, trabalhistas, republicanos e democratas ocidentais e o terrorismo é uma das suas manifestações mais abjetas. Um número superior a um milhão e trezentos mil mortos, nos países muçulmanos, representa um preço intolerável para a Humanidade. 

Sem comentários: